Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
DOI: https://doi.org/10.35416/2023.9392 1
DISPERSÃO URBANA E COVID-19: DISCUSSÕES A PARTIR DO ALTO VALE DO
ITAJAÍ/SC
DISPERSIÓN URBANA Y COVID-19: DISCUSIONES A PARTIR DEL ALTO VALE DO
ITAJAÍ, SANTA CATARINA, BRASIL
URBAN SPRAWL AND COVID-19: DISCUSSIONS FROM THE ALTO VALE DO
ITAJAÍ REGION, STATE OF SANTA CATARINA, BRAZIL
Rodrigo Sartori BOGO1
e-mail: rs.bogo@unesp.br
Como referenciar este artigo:
BOGO, Rodrigo Sartori. Dispersão urbana e Covid- 19:
Discussões a partir do Alto Vale do Itajaí/SC. Revista
Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1,
e023007. e-ISSN: 1984-1647. DOI:
https://doi.org/10.35416/2023.9392
| Submetido em: 19/05/2022
| Revisões requeridas em: 15/06/2023
| Aprovado em: 10/07/2023
| Publicado em: 10/07/2023
Editoras:
Eda Maria Góes
Karina Malachias Domingos dos Santos
Roberta Oliveira da Fonseca
1
Universidade Estadual Paulista (UNESP), Presidente Prudente SP Brasil. Doutorando em Geografia. Bolsista
FAPESP.
Dispersão urbana e Covid- 19: Discussões a partir do Alto Vale do Itajaí/SC
Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
DOI: https://doi.org/10.35416/2023.9392 2
RESUMO: A urbanização contemporânea envolve processos espaços-temporais iniciados a partir da década
de 1960, como os de dispersão e aglomeração. Esses são geralmente estudados nas metrópoles, mas ocorrem
também nas cidades médias. Dada essa realidade, aplica-se um diálogo com a geografia da saúde para estudar
a disseminação do vírus SARS- CoV-2 na aglomeração de uma cidade intermediária de Santa Catarina Rio
do Sul, Alto Vale do Itajaí buscando perceber possíveis combinações entre casos da doença e os processos
de dispersão e aglomeração. Partindo da hipótese de que municípios aglomerados à Rio do Sul teriam mais
casos relativos de Covid-19, realizou- se trabalho de metodologia quantitativa, aplicando estatística descritiva
simples e análise espacial via Sistemas de Informações Geográficas para comparação entre municípios. Os
resultados apontaram para uma refutação parcial da hipótese visto que, mesmo com os altos índices de
Laurentino e Aurora, outros municípios pequenos e até rurais apresentaram mais casos por mil que a
aglomeração regional. Conclui-se que a intensa variação nos casos deve estar mais associada à elementos do
“espaço-tempo curto” como atuação da gestão pública, hábitos da população em relação ao vírus e acesso à
serviços de saúde do que propriamente a estrutura urbana, apesar de esta ter influência.
PALAVRAS-CHAVE: Covid-19. Geografia da saúde. Dispersão urbana. Aglomeração urbana. Alto Vale
do Itajaí.
RESUMEN: La urbanización contemporánea envolví procesos espacio-temporales que se iniciaron en la
década del 1960, como los de dispersión y aglomeración. Esos son normalmente estudiados en las
metrópolis, pero también ocurren en las ciudades intermedias. En esta realidad, hicimos un dialogo con la
geografía de la salud para estudiar la diseminación del virus SARS-CoV-2 en la aglomeración de una ciudad
intermedia del estado de Santa Catarina (Brasil) Rio do Sul, región del Alto Vale do Itajaí para percibir
posibles combinaciones entre casos de la enfermedad y los procesos de dispersión y aglomeración. Con la
hipótesis de que los municipios de la aglomeración de Rio do Sul tenían más casos relativos de Covid-19,
un trabajo de metodología cuantitativa fue realizado, con estadística descriptiva simples y análisis espacial
con Sistemas de Información Geográficos para comparar esas municipalidades y las otras. Los resultados
pontean a una refutación parcial de la hipótesis porque mismo con los índices elevados de Laurentino y
Aurora, otras municipalidades pequeñas o rurales presentaran más casos por mil que la aglomeración
regional. La conclusión es que la variación de los casos está más asociada a elementos del “espacio-tempo
corto” como la actuación de la gestión pública, hábitos de la población con el virus y acceso a los servicios
de salud do que la estructura urbana, pero esta tiene influencia.
PALABRAS CLAVE: Covid-19. Geografía de la salud. Dispersión urbana. Aglomeración urbana. Alto Vale
do Itajaí.
ABSTRACT: The contemporary urbanization evolves around space-time processes that started in the 1960’s
decade, including sprawl and clustering ones. Mostly studied in the metropolises, they also occur on
intermediate cities. An approach together with health geography to study the SARS-CoV-2 coronavirus
dissemination in a Santa Catarina state’s (Brazil) intermediate city – Rio do Sul, Alto Vale do Itajaí region
was proposed, seeking to identify possible combinations between disease cases and urban sprawl and
clustering. Starting from the hypothesis that the municipalities clustered with Rio do Sul should have more
relative cases of Covid-19, we did a research based on quantitative data analysis, applying simple descriptive
statistics and spatial analysis with Geographic Information Systems to compare those municipalities to the
others. The results point out to a partial denying of the hypothesis since that, even with the high values from
the cities of Laurentino and Aurora, other small populated municipalities showed more cases per thousand
than the regional urban cluster. The conclusion points out that the intense variation in case numbers is
associated more with matters of “short space-time” like the public management measures, local population
habits in relation to the virus and health services access than the urban structure, in spite of it having some
influence.
KEYWORDS: Covid-19. Health geography. Urban sprawl. Urban clustering. Alto Vale do Itajaí.
Rodrigo Sartori BOGO
Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
DOI: https://doi.org/10.35416/2023.9392 3
Introdução
A pandemia de Covid-19 doença originada da infecção pelo coronavírus Sars- Cov-2
proclamada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em março de 2020 (SPOSITO;
GUIMARÃES, 2020) e ainda mundialmente em voga
2
apesar do constante
avanço (apesar de
desigual) da vacinação (RITCHIE et al., 2021), abalou de diversas formas a produção científica,
incluindo a das ciências humanas e sociais. Como era de se esperar, a
geografia não ficou alheia
nesse contexto específico que englobou desde um movimento de produção científica sem
precedentes dos principais periódicos do mundo
(KAMBHAMPATI et al., 2021) à uma profusão
de pre-prints questionáveis (ORSI, 2020) e diversas possibilidades de investigação vieram à tona.
Partindo de trabalhos de cunho mais
crítico (CARLOS et al., 2020) para os de matriz empírica
(BITOUN et al., 2020;
FORTALEZA et al., 2021), destaca-se a intersecção evidente entre os
campos da geografia
urbana e geografia da saúde (SPOSITO; GUIMARÃES, 2020).
Essa articulação científica, existente antes da corrente pandemia, se mostrou essencial
para compreensão de padrões, análises de tendências e proposições na linha das políticas
públicas. No entanto, esse campo de possibilidades não resultou em medidas
efetivas de controle
da pandemia pelo governo federal, visto os mais de 30.701.900 de casos
confirmados e 664.987
3
mortes causadas pela doença
4
, colocando o país entre os piores índices de mortes absolutas e
relativas (RITCHIE et al., 2021), mesmo tendo estruturas
institucionais fortes e bem
estabelecidas no campo da saúde, como o Sistema Único de Saúde
(SUS) e os conselhos de políticas
(FARIA, 2020).
Além do fator político (resumidos em negligência e negacionismo presidencial), as correntes
transformações no espaço urbano brasileiro também têm potencial explicativo na análise sobre os
números e padrões espaciais da pandemia de Covid-19. Além dos processos trans e interescalares
associados à urbanização contemporânea
5
4
que envolvem novos padrões
de mobilidade,
comunicação, renda, desigualdade e da divisão territorial do trabalho (DEMATTEIS, 1998;
BRUEGMANN, 2006), há configurações específicas da realidade latino-americana e brasileira,
2
Esta afirmação havia sido feita no início do processo editorial, em 2022. Atualmente, apesar do status de
“pandemia” se manter, a OMS declarou o fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional em
maio de 2023 (OPAS, 2023).
3
Dados de 16/05/2022. Disponível em: https://covid.saude.gov.br/. De acordo com a mesma fonte institucional,
os dados para 07/07/2023 são de 37.682.660 casos e 704.159 óbitos.
4
Ressalta-se também a subnotificação apontada por cientistas que, a partir da Síndrome Respiratória Aguda Grave
(SRAG), apontam para um número de casos e mortes potencialmente maior, justificando seu uso em estimativas
e trabalhos acadêmicos (BITOUN et al., 2020).
5
A partir dos autores, podemos citar fenômenos como dispersão, espraiamento, metropolização, periurbanização,
segregação e fragmentação socioespaciais, dentre outros
Dispersão urbana e Covid- 19: Discussões a partir do Alto Vale do Itajaí/SC
Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
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incluindo suas cidades médias/intermediárias (BELLET; LLIOP, 2004; SPOSITO; GOÉS,
2013; CHATEL; SPOSITO, 2015). Como apontam os
autores acima e pesquisas recentes do
IBGE (2020), a rede urbana do país tem apresentado
fluxos internos e externos cada vez mais
intensos com crescimento significativo dos
aglomerados urbanos, destacando-se as cidades
médias. A recente publicação dos resultados do Censo 2022 pelo mesmo instituto aponta para uma
importância ainda maior dos arranjos
populacionais de porte médio, visto que “A dinâmica
espacial da população brasileira no período 2010-2022 medida pela evolução da população total
nesse período intercensitário aponta para uma tendência de um padrão demográfico de maior
crescimento de médias Concentrações Urbanas e de perda de dinâmica demográfica das grandes
Concentrações.” (IBGE, 2023, p. 49).
Por esse motivo se delineou como recorte espacial a cidade de Rio do Sul, estado
de Santa
Catarina, e sua região de influência, o Alto Vale do Itajaí. Podendo ser considerada
uma cidade
média no contexto da rede urbana catarinense e centro de uma aglomeração urbana com outros
quatro municípios (BOGO, 2020; IBGE, 2020), o objetivo foi analisar
se os padrões de dispersão
urbana do recorte dadas as devidas proporções influenciaram
a propagação e concentração de
casos de Covid-19 no contexto regional. A hipótese é que sim, e para testá-la foi realizado
levantamento de dados, aplicação de estatística descritiva simplificada e análises espaciais a
partir de produtos cartográficos. Assim, buscou-se comparar a distribuição de casos da doença
entre os municípios aglomerados e não aglomerados com Rio do Sul, considerando seus
portes demográficos e relações na rede urbana.
Para atingir o objetivo e descrever adequadamente os passos realizados na pesquisa, o
presente artigo foi estruturado em seis partes, incluindo esta introdução. Na segunda seção é
realizada uma breve interlocução conceitual entre geografias urbana e da saúde, incluindo
estudos
empíricos para mostrar a correlação entre dispersão urbana e os fluxos de disseminação de
doenças como a Covid-19. Na seção seguinte, o recorte espacial é apresentado em maior detalhe,
tratando de sua atual estrutura e rede urbana, com potencial explicativo para o número de casos
da doença. Depois nas partes 3 e 4, respectivamente,
descrevem-se os materiais e métodos
utilizados na investigação, seguidos da apresentação e
discussão dos resultados a partir de dados
secundários e representações cartográficas. Ao
final, na última seção, são descritas nossas
considerações finais sobre os achados, os limites
do trabalho e as possíveis aberturas para novas
pesquisas.
Rodrigo Sartori BOGO
Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
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Combinações possíveis entre pandemias e dispersão urbana
Inicialmente, ressalta-se que não cabe a esse trabalho uma extensiva discussão sobre a
geografia da saúde e sua base epistemológica, por questões de foco e direcionamento
6
. No entanto,
se faz necessária uma breve síntese que possa dar os indícios de integração científica
que
fundamentam a análise aqui realizada.
A geografia da saúde presente na literatura anglo-saxônica pela dualidade de
medical
ou health geography é um campo das ciências espaciais que apresenta alto grau de
interdisciplinaridade (com medicina, psicologia e biologia, por exemplo) e que nas últimas
décadas
tem recebido interesse crescente de pesquisadores, órgãos de fomento e da mídia.
Como mostra a
publicação editada por Brown, McLafferty e Moon (2010), pesquisadores do campo trabalham com
investigações espaciais sobre bem-estar da população, saúde mental,
segurança alimentar,
infraestrutura e acesso à serviços de saúde, composição e análise de políticas públicas, padrões
geográficos de diversos tipos de doenças e, como tratado aqui, causas e direções da disseminação
de doenças infecciosas, como a Covid-19.
Tratando da geografia urbana, elementos específicos da urbanização
contemporânea
acabam por demonstrar uma série de relações com aspectos da geografia da saúde, especialmente no
último tópico listado acima. Além da maior intensidade dos fluxos e do consumo associados à
experiência do espaço-tempo (SANTOS, 2006), a lógica centro- periferia foi sobreposta por novos
processos espaciais que formaram cidades mais dispersas, fragmentadas e que vem expandindo
progressivamente sua mancha urbana (DEMATTEIS,
1998; BRUEGMANN, 2006). Na América
Latina e mais especificamente no Brasil, tais fenômenos apresentam convergências e
divergências nas metrópoles (SOUZA, 2010;
MATTOS, 2013) e apresentam reflexos
significativos também nos nós intermediários da rede
urbana (CHATEL; SPOSITO, 2015). No
caso brasileiro, as cidades médias tiveram
incremento significativo no seu papel de articulação de
fluxos e de aglutinação da urbanização nas últimas décadas, de forma altamente heterogênea
(SPOSITO; GOÉS, 2013; IBGE, 2020;
2023).
A partir dos autores acima, sabe-se que os processos de dispersão e aglomeração
urbana,
com suas particularidades e misturas no espaço urbano, estão associados à aumento
dos fluxos e da
mancha urbana das cidades, fomentando deslocamento e alcance dos
citadinos. Como descrito
em detalhe por Meade e Emch (2010, p. 351-406), esses elementos
assim como as desigualdades
socioespaciais latentes da realidade brasileira estão
diretamente associados à difusão e
6
Para uma leitura aprofundada sobre o tema indicam-se Meade e Emch (2010) e Brown, McLafferty e Moon
(2010).
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espalhamento espacial de doenças infecciosas, o que foi previsto por Sposito e Guimarães (2020).
Tais correlações fomentaram a pesquisa e a escolha
do recorte geográfico, descrito a seguir.
O recorte espacial: centralidade, dispersão e aglomeração em torno de Rio do Sul, Alto
Vale do Itajaí/SC
O fenômeno regional nem sempre deve ser tomado como explicativo no que diz
respeito
à estrutura espacial de determinada rede urbana ou a experiência de lugar por parte
de seus
habitantes. Porém, no caso do Vale do Itajaí do qual o Alto Vale faz parte a região esteve
historicamente associada à bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu, sendo este central e direcionador
das aglomerações urbanas que hoje nele existem (SIEBERT, 1996).
Como discutido por Bogo
(2020), cada uma das três sub-regiões que a formam (Baixo, Médio
e Alto Vale) é composta de
uma rede urbana com suas próprias hierarquias e que se relacionam em um binômio de
dependência versus independência, incluindo complementariedades e concorrências.
Tratando especificamente do Alto Vale, tal região é composta por 28 municípios, número
esse de vinculados à Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí
7
. O nome
advém das
características geomorfológicas, classificada como Patamares do Alto Rio Itajaí, apresentando vales
menos profundos e relevo menos declivoso do que o visto em Blumenau (Médio Vale) e altitude bem
mais elevada que a planície costeira, onde estão Itajaí e Balneário
Camboriú (Baixo Vale) (BOGO,
2020).
Historicamente, a distância para o litoral e a colonização relativamente tardia
(últimos
anos do século XIX) levaram a atual rede urbana a ser menos densa e mais modesta que a das
principais aglomerações da mesorregião. Porém, a centralidade regional exercida
por Rio do Sul
ainda é significativa, apresentando certo dinamismo e alguns processos
espaciais diretamente
associados à urbanização contemporânea (COLAÇO; KLANOVICZ,
1999; idem, 2020).
Quantificando o argumentado acima, a estimativa populacional de Rio do Sul é de
72.931
habitantes, quase inteiramente urbana e com matriz econômica em torno de comércio/serviços
e indústria (IBGE, 2021). Sua posição hierárquica na rede urbana é, de acordo com o IBGE
(2020) a de Centro Sub-regional A, recebendo influência direta de Blumenau (Capital regional
B) e de Florianópolis, alçada recentemente ao status de metrópole. Em primeira vista, pode
parecer um erro conceitual atribuir o grau de cidade
intermediária à Rio do Sul no contexto
brasileiro ou até da América Latina (BELLET; LIOP,
2019), mas como argumenta Whitacker
7
Lista disponível em: https://www.amavi.org.br/municipios-associados/perfil. Acesso em: 17 maio 2022.
Rodrigo Sartori BOGO
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(2019), é necessário expandir a interpretação em direção à aglomeração, vista no nosso estudo
de caso pela Figura 1.
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Fonte: IBGE (2020)
Reforçando as ideias do autor (idem, 2019), a cidade média deve ser interpretada na
rede sob
o ponto de vista de sua dispersão e/ou aglomeração urbana, sem estar circunscrita
exclusivamente
aos limites administrativos, o que se aplica aqui. Esta interpretação é também seguida pelo IBGE
(2020, 2023) em suas pesquisas mais recentes. Rio do Sul compõe hoje, a partir da terminologia
proposta por Chatel e Sposito (2015), o centro de uma aglomeração
com outros quatro munícipios
Agronômica, Aurora, Laurentino e Lontras que contém
uma população estimada de 103.839
habitantes, representada espacialmente no mapa acima.
Além da questão demográfica (Figuras 2 e 3), destacam-se os argumentos de autores como
Bellet e Llop (2004), Sposito e Goés (2013) e Bitoun, Miranda e Moura (2017) de que a condição
de cidade média/intermediária deve ser analisada sob uma perspectiva qualitativa
(somando-se à
demográfica) que considere papéis, funções e intermediação na rede como
fatores principais. Dito
isso, ao tratar a realidade geográfica de Santa Catarina - um estado de pouco mais de 7 milhões de
habitantes (IBGE, 2023), com rede urbana relativamente densa, mas com fragmentações regionais
(SIEBERT, 1996) e a posição da aglomeração de Rio do
Sul nela, articulada diretamente com
dois dos nós mais elevados dessa rede Blumenau e
Florianópolis é possível assumir sua
classificação enquanto de cidade intermediária. Isso justifica o interesse em estudar a relação entre
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dispersão urbana e a disseminação da Covid-
19, fenômenos de características diferentes e que
recebem maior atenção nas metrópoles, mas que também apresentam reverberações nas cidades
médias.
Figura 2
População total projetada dos municípios da aglomeração de Rio do Sul/SC
Fonte: IBGE (2021). Elaborado pelo autor
Figura 3
Proporção da situação domiciliar (%) da população por município
Fonte: IBGE (2010). Elaborado pelo autor
No caso de Rio do Sul, que naturalmente articula as dimensões do geral, do particular e
do singular (SPOSITO; GOÉS, 2013; CORRÊA, 2022), sua dispersão se deu numa mistura das
estruturas básicas de ponto e eixo, de acordo com a proposta de Chatel e Sposito (2015). O
primeiro caso se trata da área em torno da confluência dos rios Itajaí do
Norte e Itajaí do Oeste,
5.687
Rio do Sul Lontras Laurentino Aurora Agronômica
Rodrigo Sartori BOGO
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formando o Itajaí-Açu
8
, que ao aglutinar os bairros Centro e Jardim
América forma o que
Whitacker (2017) classificaria como o seu centro consolidado, que exerce forte centralidade
intra e interurbana. Já a dispersão em eixo ocorreu ao longo do
curso d’água principal e também
de avenidas e rodovias, destacando-se SC-350 e a BR-470,
que apresentam formas e funções de
uma zona pericentral, vide classificação do autor.
No caso riossulense, existem argumentos de Colaço e Klanovicz (1999) e Bogo (2020)
sobre o impacto de incremento demográfico, inundações e preço do solo como geradores de
transformações no padrão de urbanização local. Somam-se também os processos
impulsionadores da dispersão, especialmente evidentes na América do Norte e
Europa e que
também ocorrem no Brasil (com suas particularidades de caráter socioespacial), como: maior acesso
ao transporte individual, inovações em telecomunicações, exploração do
solo urbano e aumento na
renda (DEMATTEIS, 1998; BRUEGMANN, 2006; CHATEL; SPOSITO, 2015).
Apesar de as últimas autoras acima apontarem uma oposição entre os fenômenos de
dispersão e aglomeração
9
, também apresentam um elemento particular que abrange o recorte
espacial e que tem potencial explicativo relevante, visto que “O estado de Santa Catarina tem
aglomerados urbanos com os contornos mais irregulares do Brasil (...) é também o estado em
que se encontra o maior número de pequenas propriedades rurais.” (CHATEL; SPOSITO, 2015,
p. 136-137). Como descrito por Siebert (1996), é justamente
essa estrutura fundiária baseada no
minifúndio, herdada historicamente, que serviu de base para uma rede urbana repleta de pequenos
núcleos urbanos com alta proximidade geográfica.
Assim, à medida que a malha urbana
riossulense se expandiu nas últimas décadas, sua
proximidade com núcleos urbanos próximos e
dependentes causou uma aglomeração, ainda
que não tão densa quanto algumas das mais
importantes cidades médias brasileiras.
Partindo do princípio de que é internamente às aglomerações que ocorrem de forma
mais
intensa os fluxos e circulação de pessoas com o principal da rede urbana local, em comparação
com os que estão “fora (MATTOS, 2013), e o quanto associação com os
preceitos de
disseminação da Covid-19 (SPOSITO; GUIMARÃES, 2020), buscou-se analisar
se houve diferença
no número de casos da doença entre municípios da mesma região e de porte semelhante.
8
“Ponto” esse que Colaço e Klanovicz (1999) chamam do “nó estruturador urbano” de Rio do Sul.
9
“A dispersão é contrária à aglomeração, uma vez que supõe uma distribuição e um espraiamento da população e
das atividades em zonas separadas e descontínuas no espaço.” (CHATEL; SPOSITO, 2015, p. 122).
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Materiais e métodos
O presente trabalho está baseado em metodologia quantitativa de coleta e análise dos
dados, à medida que se baseia em informações primárias e secundárias, sendo elas de cunho
estatístico (descritivo simplificado), espacial ou georreferenciada. De acordo com
Burchell
(2006), a análise de dados de matriz quantitativa está sustentada na possibilidade de visualização
numérica dos eventos, o que pode ser aplicado à fenômenos sociais a partir de seu adequado
tratamento. Porém, o autor reforça que, em geral, a atividade de analisar fatos
sociais (e reforça-se,
espaciais) unicamente a partir de sua quantificação tende a ser
demasiadamente simplificador das
relações e possibilidades que ocorrem na realidade.
Por isso, utiliza-se aqui também literatura secundária de base científica calcada
principalmente em livros acadêmicos e artigos publicados em periódicos revisados pelos pares
para complementar a análise com a perspectiva qualitativa. Para tal, foram
selecionados
principalmente autores nacionais e internacionais dos campos da geografia da
saúde e da geografia
urbana, buscando incrementar a discussão em torno dos resultados obtidos a partir dos dados
tratados por estatística descritiva e representação espacial.
Tratando especificamente do banco de dados, esse foi formado por via da coleta
das
variáveis escolhidas em relação à incidência e o impacto da Covid-19
10
em Santa Catarina, sendo
depois filtrado para os municípios específicos. Estes, por sua vez, são os que englobam a aglomeração
de Rio do Sul, sendo comparados a outros municípios de porte demográfico semelhante e
subordinados à tal Centro Sub-regional A (IBGE, 2020; 2021), não descartando
a possibilidade de
trabalhar com índices e médias de todos os municípios, assim como
observar elementos
particulares (relação de população urbana e rural e o acesso às rodovias, por exemplo). Os casos
utilizados para comparação direta estão descritos na Tabela 1, abaixo.
Além disso, ressalta-se a
própria natureza dos dados secundários, que são somente uma
representação parcial da realidade,
especialmente por conta do baixo índice de testagem do
Brasil, de pouco mais de 300 a cada mil
habitantes (RITCHIE et al., 2021).
10
Estes são: nome do município e geocódigo, população estimada, data da última atualização, número de casos
(absolutos e a cada mil/hab) e mortes confirmadas, taxa de mortalidade. O enfoque maior será dado no número de
casos (absoluto e relativo), dados muito fatores que englobam a mortalidade (BITOUN et al., 2020).
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Tabela 1
Municípios comparados em relação aos casos de Covid-19
Município
(parte da
aglomeração)
População
estimada
(2021)
Município
(fora da
aglomeração)
População
estimada
(2021)
Município
(fora da
aglomeração)
População
estimada
(2021)
Lontras
12.497
Agrolândia
11.160
Pouso
Redondo
17.965
Laurentino
7.154
Rio do Oeste
7.552
Tromb.
Central
7.506
Aurora
5.687
Petrolândia
5.873
Imbuia
6.284
Agronômica
5.570
José Boiteux
5.019
Rio do Campo
5.864
Fonte: IBGE (2021). Elaborado pelo autor.
Os dados associados às variáveis de saúde trabalhadas foram retirados do portal
Brasil.io
11
, que seleciona e filtra as informações fornecidas pelas secretarias estaduais de saúde,
agregando-as no nível do município. A utilização dos dados nesse formato permitiu a realização de
operações de estatística descritiva simplificada por via do software Microsoft
Excel 2016, o que
serviu tanto para confecção de gráficos que fundamentam os resultados
em si, como deram base
para sua manipulação em ambiente SIG (Sistemas de Informações
Geográficas), em específico o
QGIS versão 2.18.19. De acordo com Chang (2019, p. 1, tradução nossa) o SIG “(...) é um
sistema computacional para captura, armazenamento, seleção, análise e representação de dados
geoespaciais. Uma de suas muitas aplicações é o gerenciamento de desastres”.
O autor também estabelece que estes estão fundamentados em quatro
componentes, com
relevante variabilidade interna: os hardwares; os softwares; as pessoas
(profissionais e
pesquisadores que executam os processos); e as organizações que fazem
parte. Por fim, reforça-
se a importância do geoprocessamento para as análises urbanas e em geografia da saúde, aspecto
argumentado por Meade e Emch (2010), que se faz presente na
seguinte discussão e análise dos
resultados.
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Disponível em: https://brasil.io/covid19/a. Acesso em: 17 maio 2022. Os dados são relativos a 25/11/2021, data
de realização da pesquisa e também de disseminação da variante ômicron, com potencial de contaminação bem
superior às anteriores (INSTITUTO BUTANTAN, 2022) o que poderia distorcer a análise.
Dispersão urbana e Covid- 19: Discussões a partir do Alto Vale do Itajaí/SC
Revista Geografia em Atos, Presidente Prudente, v. 7, n. 1, e023007, 2023. e-ISSN: 1984-1647
DOI: https://doi.org/10.35416/2023.9392 12
Resultados e discussão
Um primeiro olhar em relação aos dados obtidos e tratados já fornece alguns resultados.
Em relação à região como um todo, o total de casos contabilizados na data da coleta é de 39.497,
o equivalente à 131,70 casos a cada mil habitantes. Esse índice é
significativamente inferior à
média estadual a segunda pior do Brasil de aproximadamente 170
12
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. Provavelmente, essa
diferença se dá por alguns dos elementos regionais comentados
anteriormente, como: rede urbana
de demografia modesta, a vocação rural de muitos dos
municípios, a distância para aglomerações
urbanas mais dinâmicas como as de Blumenau e Itajaí-Balneário Camboriú-Camboriú-Itapema
(SIEBERT, 1996; IBGE, 2020; BOGO, 2020)
e até o melhor acesso à infraestrutura de saúde,
tópico que demandaria um estudo mais aprofundado.
Por ora, é relevante ressaltar que o valor descrito acima se trata de uma média e, na
verdade,
os índices municipais apresentam grande variação interna na rede urbana do Alto Vale. Tomando
como exemplos os extremos da coleta, há desde o caso de Braço do
Trombudo, com mais de 200
casos por mil habitantes, até Santa Terezinha, no limite inferior com pouco mais de 66. As
desigualdades encontradas dão base para a discussão em torno da
hipótese, por apresentarem
alguns padrões espaciais claros e outros nem tão fáceis de desvendar. Este debate será
aprofundado a partir das Figuras 4 e 5, que apresentam dados
absolutos e relativos sobre os
conjuntos comparativos (aglomerado versus não aglomerado) e
a região como um todo.
Figura 4
Casos por mil em quatro conjuntos espaciais
Fonte: BRASIL.IO (2021). Elaborado pelo autor
.
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Conforme dados compilados pelo portal Congresso em Foco. Disponível em:
https://congressoemfoco.uol.com.br/covid19/. Acesso em: 26 nov. 2021.