Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
DOI: https://doi.org/10.32930/nuances.v34i00.10262 1
O “SABE COM QUEM ESTÁ FALANDO?” E A EDUCAÇÃO SUPERIOR PRIVADA
NO BRASIL: PARADOXOS E DILEMAS PARA UMA INTERPRETAÇÃO CRÍTICA
¿SABE USTED CON QUIÉN ESTÁ HABLANDO? Y LA ENSEÑANZA SUPERIOR
PRIVADA EN BRASIL: PARADOJAS Y DILEMAS PARA UNA INTERPRETACIÓN
CRÍTICA
DO YOU KNOW WHO YOU'RE TALKING TO? AND PRIVATE HIGHER EDUCATION
IN BRAZIL: PARADOXES AND DILEMMAS FOR A CRITICAL INTERPRETATION
João Nicodemos Martins MANFIO1
e-mail: jnmmanfio@gmail.com
Como referenciar este artigo:
MANFIO, J. N. M. O “sabe com quem está falando?” e a educação
superior privada no Brasil: paradoxos e dilemas para uma
interpretação crítica. Nuances: Estudos sobre Educação,
Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-
0441. DOI: https://doi.org/10.32930/nuances.v34i00.10262
| Submetido em: 18/07/2023
| Revisões requeridas em: 22/10/2023
| Aprovado em: 05/11/2023
| Publicado em: 30/12/2023
Editores:
Profa. Dra. Rosiane de Fátima Ponce
Prof. Dr. Paulo César de Almeida Raboni
Editor Adjunto Executivo:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
1
Centro Universitário UNISOCIESC (UNISOCIESC), Joinville SC Brasil. Graduado em Ciências Sociais pela
Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Mestre em Sociologia Política Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Doutor em Ciências Sociais - Antropologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-
SP). Pós-doutorado em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Coordenador do Núcleo
de Estudos de Sociologia Contemporânea: Zygmunt Bauman (NESC-CNPq).
O “sabe com quem está falando?” e a educação superior privada no Brasil: Paradoxos e dilemas para uma interpretação crítica
Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
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RESUMO: Este trabalho tem como objetivo estabelecer um diálogo sobre a educação superior
privada no Brasil, fundamentado na antropologia de Roberto DaMatta. Através da análise das
ideias do autor acerca de situações cotidianas e eventos do ensino superior, busca-se destacar
dilemas e paradoxos que necessitam ser enfrentados. Propõe-se uma reflexão que introduz
possíveis contribuições da antropologia brasileira para os fenômenos educacionais no ensino
superior privado, instigando a necessidade de criar alternativas e realizar questionamentos
críticos sobre as práticas existentes nesse contexto. A análise do jeitinho, da hierarquização, do
“sabe com quem está falando?”, do conservadorismo e dos ritos sociais visa ampliar as noções
comumente aplicadas na compreensão dos fenômenos educacionais.
PALAVRAS-CHAVE: Educação superior privada. Antropologia. Cultura brasileira. Ritos
sociais.
RESUMEN: Este artículo pretende promover un diálogo sobre la enseñanza superior privada
en Brasil a partir de la antropología de Roberto DaMatta. Cotejando las ideas del autor sobre
situaciones y hechos cotidianos en la educación superior, buscamos señalar dilemas y
paradojas a ser enfrentados. Proponemos una reflexión que trae a colación posibilidades de
contribución de la antropología brasileña a los fenómenos educativos en la enseñanza superior
privada, provocando la necesidad de crear alternativas y cuestionar críticamente lo que se ha
hecho en esta área. Creemos que el análisis del "jeitinho", de la jerarquización, del "¿sabes
con quién estás hablando?", del conservadurismo y de los ritos sociales permite ampliar las
nociones usualmente aplicadas para la comprensión de los fenómenos educativos.
PALABRAS CLAVE: Enseñanza superior privada. Antropología. Cultura brasileña. Ritos
sociales.
ABSTRACT: This work aims to establish a dialogue on private higher education in Brazil,
based on the anthropology of Roberto DaMatta. Through analyzing the author's ideas
regarding everyday situations and events in higher education, the goal is to highlight dilemmas
and paradoxes that need to be addressed. A proposed reflection introduces possible
contributions from Brazilian anthropology to educational phenomena in private higher
education, prompting the need to create alternatives and pose critical questions about existing
practices in this context. The analysis of the 'jeitinho' (finding a way), hierarchy, 'do you know
who you're talking to?', conservatism, and social rites aims to expand the notions commonly
applied in understanding educational phenomena.
KEYWORDS: Private higher education. Anthropology. Brazilian culture. Social rites.
João Nicodemos Martins MANFIO
Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
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Introdução
Esse artigo objetiva suscitar e ampliar o debate de ideias no campo da educação superior
privada a partir de uma visão da antropologia de Roberto DaMatta. Se o rito de autoridade
manifesto na expressão “você sabe com quem está falando?
2
pode ser revelador da vida social
brasileira, poderá também ser elemento gerador de compreensão a respeito das práticas sociais
contidas no bojo do sistema de ensino superior privado? Essa é a pergunta de partida deste
artigo e o tema sobre o qual será desenvolvido o trabalho e construídas reflexões.
Roberto Augusto DaMatta (1984, 1993, 1997a, 1997b) dedicou, e ainda dedica, sua vida
à interpretação dos ritos sociais e práticas cotidianas brasileiras. Desde o carnaval e a semana
da pátria, o jeitinho e a malandragem, as procissões religiosas, os espaços da casa, da rua e do
trabalho, a morte, e mais recentemente o trânsito, tem revelado aspectos importantes do
chamado modo de ser social brasileiro, subsidiando elementos para análise de outros
fenômenos.
As experiências vividas no contexto da sala de aula ou mesmo nos ambientes físicos
destas, no âmbito da educação superior privada, constituem o ponto de partida para as
ponderações que se seguirão. Ocorre que várias passagens dos livros de DaMatta (1984, 1993,
1997a, 1997b) se referem justamente a contextos de hierarquização, disputas de poder, maneiras
de se resolver situações (jeitinho, “sabe com quem está falando”), posições e atitudes frente às
críticas, características culturais que marcam o jeito de ser brasileiro e realidades cotidianas
trazidas de fora para dentro da universidade.
Não é comum utilizar a percepção detalhista e descritiva do cotidiano brasileiro
levantado pela teoria antropológica de DaMatta (1984, 1993, 1997a, 1997b) para se
compreender ou elaborar reflexões relacionadas à educação. De outro lado, grande parte dessa
percepção, contida em suas obras, pode ser vista e vivenciada nas salas de aula com frequência
e bastante proximidade com o que é apresentado em seus livros. A seguir, serão apresentados
pontos cruciais da obra desse autor, propiciando a análise de fenômenos cotidianos e permitindo
a compreensão destes por meio de uma reflexão voltada para o campo da educação.
A intenção não é construir uma tese, uma vez que isso demandaria um aprofundamento
digno de uma dissertação maior e pesquisa empírica. O propósito é investigar a possibilidade
de diálogo entre o que DaMatta escreve e o contexto cotidiano da educação superior privada.
2
O estudo de Roberto DaMatta aborda esse tema no capítulo “Sabe com quem está falando”? Um ensaio sobre a
distinção entre indivíduo e pessoa no Brasil no livro Carnavais, Malandros e Heróis: para uma sociologia do
dilema brasileiro (1997b).
O “sabe com quem está falando?” e a educação superior privada no Brasil: Paradoxos e dilemas para uma interpretação crítica
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Ao percorrer um caminho pouco comum, uma vez que, até o presente momento, não foram
identificados estudos nesse sentido, busca-se provocar e incentivar estudantes e pesquisadores
da área da educação a incorporarem ou aprofundarem essa discussão antropológica brasileira
em suas pesquisas.
Em seguida, será desenvolvido um estudo bibliográfico que visa estabelecer uma
conexão entre trechos da obra de DaMatta (1997b) com situações cotidianas do contexto do
ensino superior privado. Também são apresentados autores da educação, como Saviani (2008),
Freire (2000), Fernandes (1960), Veiga (2009), Bourdieu e Passeron (1975), com o objetivo de
fundamentar e respaldar a construção teórica. Nas considerações finais, são levantadas algumas
questões que relacionam os aprendizados dessa espécie de antropologia do cotidiano escolar,
buscando estabelecer conexões com as responsabilidades esperadas e atribuídas às instituições
de ensino superior privadas.
Ao refletir sobre o cotidiano de estudantes, professores e gestores imersos nos
fenômenos antropológicos descritos por DaMatta (1997b), e considerando que esses fazem
sentido para analisar a realidade, como se acredita, surgem uma série de questionamentos que
poderiam e deveriam ser considerados na elaboração de roteiros de ação, currículos e até
políticas públicas no âmbito da educação superior privada.
Os dilemas culturais brasileiros apontados por DaMatta
Em uma sociedade onde predomina a desigualdade e as relações sociais se estabelecem
em um emaranhado ltiplo de características culturais, deixar de lado os apontamentos
antropológicos, parece ser o equivalente a desprezar uma rica fonte de possibilidades de análise
e compreensão sobre a sociedade, e, por consequência, a elaboração de instrumentos de
transformação da realidade.
No Brasil, uma série de autores e estudiosos que dedicaram suas vidas à interpretação
do país, os quais, não raramente, parecem ter falado e escrito ao vento. Supõe-se que, assim
como Florestan Fernandes percebeu ao tecer críticas ao projeto de lei de diretrizes e bases da
educação:
Limitamo-nos a defender ideias e princípios que deixaram de ser matéria de
discussão política nos países adiantados. Tudo se passa como se o Brasil
retrocedesse quase dois séculos, em relação à história contemporânea
daqueles países, e como se fôssemos forçados a defender, com unhas e dentes,
os valores da Revolução Francesa! É uma situação que seria cômica, não
João Nicodemos Martins MANFIO
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fossem as consequências graves, que dela poderão advir. A nossa posição
pessoal pesa-nos como incômoda (FLORESTAN FERNANDES, 1960, p.
220).
Cria-se, com isso, uma sensação de inautenticidade na cultura do país, geradora de
importações de porções de cultura alheia que se supõe superior e se imita desenfreadamente. É
necessário verificar em que medida isso ocorre efetivamente no contexto do ensino superior e
se existe uma relação entre esse “transplante cultural” e a ausência de um sistema educacional,
especialmente no caso específico deste estudo, que aborda o ensino superior privado no Brasil.
No Brasil, acredita-se que o ensino superior faça toda a diferença no que diz respeito ao
amadurecimento intelectual e crítico. Pode-se concordar com isso em parte, pois é inegável que
o exercício da educação cause transformações nos sujeitos, dadas as demandas e os processos
relacionados ao ensino e aprendizagem. Contudo, isso não implica, naturalmente, em auxílio
direto no processo de construção de mobilidade social e contribuições efetivas na diminuição
da desigualdade e no fortalecimento da democracia.
As manifestações ocorridas dentro das salas de aula, por exemplo, relacionadas à
punição, às cotas raciais e econômicas, à homoafetividade, à economia e à política, evidenciam
o lado mais perverso e atrasado daqueles que, teoricamente, deveriam propagar ideias
democráticas e críticas. Ou o efeito da sala de aula e do ensino superior é insuficiente, ou o que
é discutido ali não nos incomoda a ponto de gerar uma agenda em busca de transformação
social.
Nesse contexto, a leitura antropológica de DaMatta (1997b) revela que expressões como
“sabe com quem está falando?”, entre outras características relevantes, contrariam o modo de
ser do brasileiro ao manifestar uma proximidade com a formalidade e ao expor preconceitos
classificados como velados. Esses rituais elucidam uma série de conceitos e percepções de
DaMatta (1997a) sobre o Brasil, os quais podem lançar luz sobre as práticas educacionais no
âmbito das instituições, como o “jeitinho”, a malandragem, o patrimonialismo, a meritocracia,
o fatalismo, a hierarquização e a pessoalidade.
As escalas hierárquicas no Brasil, também evidenciadas na educação, coexistem e são
visíveis, mas muitas vezes são encobertas por uma camada de hipocrisia, como se fosse uma
regra incontestável que estabelece que “cada um deve saber o seu lugar”. O ritual de autoridade
em questão surge como uma lembrança, uma reafirmação que representa a negação do
“jeitinho(DAMATTA, 1997a) e da cordialidade (HOLANDA, 1995).
O “sabe com quem está falando?” e a educação superior privada no Brasil: Paradoxos e dilemas para uma interpretação crítica
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Por outro lado, o “jeitinho” e a malandragem têm se destacado, indo além de simples
instrumentos de sobrevivência em uma sociedade ainda desorganizada e em desenvolvimento.
Alarmantemente, essas práticas emergem nos escândalos de corrupção política e desvios de
verbas do Estado, resultando em atrasos e consequências nefastas, especialmente para a
população mais carente.
Enquanto, por diversos motivos, somos avessos ao formalismo, ao menos nas práticas
cotidianas, desafiando a lei social imposta pelas classes dominantes, alguns rituais manifestam
paradoxos fascinantes sobre como as relações sociais se desenrolam em um país onde uma
considerável preocupação com a posição social e uma notável consciência das regras e recursos
relacionados à manutenção, perda ou ameaça dessas posições. DaMatta invoca Alexis de
Tocqueville para lembrar que,
[...] Nas comunidades aristocráticas, onde um pequeno número de pessoas
dirige tudo, o convívio social entre os homens obedece a regras convencionais
estabelecidas. Todos conhecem ou pensam conhecer exatamente as marcas de
respeito ou atenção que devem demonstrar, e presume-se que ninguém ignore
a ciência da etiqueta. Os costumes e praxes estabelecidos pela primeira classe
da sociedade servem de modelo a todas as outras, cada uma das quais, por sua
vez, estabelece seu código próprio, a que todos seus membros o obrigados
a obedecer. Assim, as regras de polidez formam um complexo sistema de
legislação, difícil de ser dominado perfeitamente, mas do qual é perigoso para
qualquer um desviar-se; por isso, os homens estão constantemente expostos a
infligir ou receber, involuntariamente, afrontas amargas (DAMATTA, 1997b,
p. 188).
A partir dessas constatações, emergem dois problemas que contrariam a lógica
democrática, evidenciando-se de maneira específica no ambiente cotidiano das salas de aula. O
questionamento “sabe com quem está falando?” limita as iniciativas progressistas
3
dos
professores do ensino privado, uma vez que, receosos quanto ao alcance de seus discursos,
tendem a evitar compromissos, preocupados com os resultados institucionais de possíveis
abordagens críticas e transformadoras.
Diversas reações podem ser observadas, desde pressões por parte da direção das
instituições, que, estrategicamente, defendem posições políticas necessárias para sua
3
No que se refere aos professores progressistas Paulo Freire diz: “No meu entender, nunca foram tão necessários
quanto hoje o trabalho sério, a pesquisa meticulosa, a reflexão crítica em torno do poder dominante que ganha
dimensões cada vez maiores. A atividade dos intelectuais progressistas jamais pode ser a de quem, reconhecendo
a força dos obstáculos, os transforma ou os toma como irresponsáveis. Essa seria uma posição fatalista, de
acomodação, que não tem nada a ver com a tarefa dos progressistas. Destes e destas, tomando os obstáculos como
desafios, a tarefa é buscar respostas a eles adequadas” (FREIRE, 2012, p. 69).
João Nicodemos Martins MANFIO
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sobrevivência econômica, até as coordenações de curso, que enfrentam considerável pressão na
busca pela criação de novas turmas a cada semestre. Essas pressões alcançam também os
próprios alunos, que contam com a “arma” da avaliação docente institucional, cujo peso é
significativo nas carreiras docentes e nos consequentes aumentos salariais da classe de
professores.
É relevante salientar também a pressão do Estado, que, por vezes, demonstra
preocupação em “aperfeiçoar” os indicadores do ensino superior a qualquer custo, resultando
em uma busca desenfreada e, por vezes, irresponsável pelo aumento do número de alunos nos
cursos superiores. Cumpre ressaltar que não se trata aqui de contestar as políticas de acesso ao
ensino superior, o que é admirável e necessário, inclusive para a redução das desigualdades
sociais tão prejudiciais à nossa sociedade. A crítica está voltada para a busca simplificada por
números, desconsiderando o aspecto fundamental de todo o processo, que é o desenvolvimento
crítico e transformador da sociedade em seus diferentes aspectos.
O próprio Roberto DaMatta expôs em seu livro “O que faz o brasil, Brasil?” (1984) a
necessidade de se distinguir o Brasil com “b” minúsculo do com “B” maiúsculo. primeiro
refere-se a critérios relativos a números e definições objetivas, quantitativas e claras, alinhados
a modelos classificatórios estabelecidos pelo Ocidente após a Revolução Francesa e Industrial,
como nos casos dos Estados Unidos, França, Inglaterra e Alemanha. o Brasil com “B”
Maiúsculo é algo complexo, enraizado na cultura, no local geográfico, no “pedaço de chão
calçado com o calor de nossos corpos, lar, memória e consciência de um lugar como qual se
tem uma ligação, única, totalmente sagrada” (1984, p. 11-12). Diz ainda:
É uma descoberta importante, creio, dizer que nós temos dado muito mais
atenção a um só desses eixos classificatórios, querendo discutir o Brasil
apenas como uma questão da modernidade e de sua economia e política; ou,
ao contrário, reduzindo sua realidade a um problema de família, de relações
pessoais e de cordialidade. Para mim, não se trata nem de uma coisa nem de
outra, mas das duas que são dadas de modo simultâneo e complexo. Nessa
perspectiva, que é a deste pequeno livro, a chave para entender a sociedade
brasileira é uma chave dupla. De um lado, ela é moderna e eletrônica, mas de
outro é uma chave antiga e trabalhada pelos anos. É típica de nosso sistema
essa capacidade de misturar e acasalar as coisas que tenho discutido no meu
trabalho como uma atividade relacional, de ligar e descobrir um ponto central
(DAMATTA, 1984, p. 19).
Muitos professores, advindos de variados centros de pesquisa e formação, haviam
incorporado tal mentalidade na própria formação, o que significa dizer que a escola
conservadora lhes causou estragos enormes e marcas que serão repassadas ao longo de sua
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carreira para quem perto deles estiver. As iniciativas transformadoras tendem, com isso, a
esbarrar contra construção de sua própria história de vida enquanto acadêmicos. Uma reunião
de professores não raramente demonstra tais posições conservadoras em suas usuais
manifestações frente a determinados assuntos. O rito de autoridade vivenciado, compartilhado
a seguir, remete à propagação dos modelos de controle panópticos de Foucault (2012)
4
e
reprodutores de Bourdieu e Passeron (1975)
5
.
Se a democracia pressupõe direitos iguais, nesse contexto, não desejo de
transformação isolado ou iniciativa diferenciada que sobreviva por muito tempo. uma
tendência no ensino conservador, esmagadora, que leva novas iniciativas a caírem do desuso
rapidamente sem a necessidade de confrontos, que se tornam cada vez mais pontuais na medida
em que o padrão recorrente se estabelece como preponderante. Nesse espaço, a recorrência da
arbitrariedade entre os agentes envolvidos parece ser resultado inevitável. Parafraseando um
ditado popular brasileiro: “chora menos quem pode mais!”. A disputa de poder, pelo poder e
para poder se dá de forma desenfreada, na base do cada um por si, o que mais uma vez contraria
a lógica democrática e constitucional de que “todos são iguais perante a lei” (BRASIL, 2016,
p. 15), conforme estabelecido no artigo 5º da Constituição brasileira.
O segundo problema decorre das iniciativas de sobrevivência no âmbito dessas relações
e sua complexidade. O jeitinho aparece como solução inevitável nas relações sociais. É ele
que tapa os olhos de quem não deve ver em determinadas situações, é com ele que por vezes se
consegue atingir o inatingível, e sem ele a vida social perde sua graça e sua razão. No contexto
brasileiro, a sociedade valoriza a prática do “jeitinho”, o que nos diferencia, por exemplo, dos
Estados Unidos, onde essa abordagem é frequentemente desaprovada.
Na situação em questão, a resolução de situações optou por trilhar o caminho da
informalidade e pessoalidade. “Dá-se jeito pra tudo, menos pra morte”, como diz outro ditado
popular brasileiro. O atraso se justifica por motivos incontestáveis, o aumento salarial pode
ocorrer por razões de pessoalidade, o número de faltas é relativo, dependendo dos motivos que
devem ser considerados. As notas podem ser revistas mediante justificativas plausíveis que
4
Para Foucault: “Pode-se então falar, em suma, da formação de uma sociedade disciplinar nesse movimento que
vai das disciplinas fechadas, espécie de “quarentena” social, até o mecanismo indefinidamente generalizável do
“panoptismo”. Não que a modalidade disciplinar do poder tenha substituído todas as outras; mas porque ela se
infiltrou no meio das outras, desqualificando-as às vezes, mas servindo-lhes de intermediária, ligando-as entre si,
prolongando-as, e principalmente permitindo conduzir os efeitos de poder até os elementos mais tênues e mais
longínquos. Ela assegura uma distribuição das relações de poder (2012, p. 204)”.
5
A obra de Bourdieu e Passeron, “A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino, 1975” aponta
que numa formação social determinada, a cultura legítima, isto é, a cultura dotada de legitimidade dominante, não
é outra coisa que o arbitrário cultural dominante, na medida em que ele é desconhecido em sua verdade objetiva
de arbitrário cultural e de arbitrário cultural dominante.
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estão à frente das decisões burocráticas, a avaliação do professor pode depender de sua relação
pessoal com os alunos, e as burocracias e formalidades são frequentemente deixadas de lado
em prol da harmonia e de manter cada um em seu lugar.
A resolução de problemas assentada nessa lógica é defendida como aspecto moral da
sociedade brasileira. O que Almeida (2007) chama de zona cinzenta moral da sociedade, é a
maneira supostamente mais lógica de se resolver os conflitos. Entre a lei fria e a regra que nos
torna iguais, existem as amizades e as situações em que a pessoalidade substitui a lei. Quem
resiste ao pedido de um amigo? Ou como não ajudar quem um dia me ajudou? Uma mão lava
a outra, e, se aos amigos devo tudo, aos inimigos dá-se o rigor da lei. Essa lógica complexa de
relações sociais é permeada por detalhes inexplicáveis em outros países, onde as regras
funcionam ou simplesmente não existem, como diria DaMatta (1984).
Os ritos sociais manifestam-se no cotidiano das sociedades, em diversos contextos e por
diferentes motivos. É interessante, principalmente, compreender como esses rituais ocorrem
especificamente no âmbito do ensino superior privado. A análise da educação a partir das
escolas clássicas tornou-se recorrente, e parece que os resultados desses estudos frequentemente
se alinham às expectativas, como se fossem uma encomenda com garantia de entrega, embora
o desembrulhar desse pacote nem sempre represente satisfação. Diante disso, torna-se
necessário, para adicionar um toque de realidade e proximidade com a vivência cotidiana,
responder ao chamado dos teóricos brasileiros e estudá-los de maneira mais aprofundada.
Mais do que apenas revelar detalhes específicos, é crucial empregar esforços para
compreender e interpretar a realidade. Nesse sentido, os teóricos brasileiros oferecem um
material abundante proveniente de pesquisas de campo e estudos aprofundados sobre nossa
cultura. Em particular, parte da obra de DaMatta (1997b), apesar de escrita nas décadas de 70
e 80, pode ser considerada atemporal. Isso é evidente ao perceber que práticas analisadas por
ele ainda prevalecem no cotidiano brasileiro. Uma prova disso é o livro de Alberto Carlos
Almeida, intitulado “A Cabeça do Brasileiro” (2007), que, por meio de uma pesquisa
minuciosa, demonstrou que as questões propostas e analisadas por DaMatta ao longo de sua
carreira continuam evidentes e latentes em nossa sociedade. O autor comenta sobre a obra de
DaMatta, afirmando que:
[...] explorando alguns de seus conceitos centrais em nossa Pesquisa Social
Brasileira. Abordamos diferentes aspectos da vida nacional. Da sexualidade à
corrupção, do recurso do jeitinho às punições ilegais, da ideia do Estado
paternalista à prática do preconceito racial. [...] Nossa pesquisa mostrou que
Roberto DaMatta está essencialmente correto. O Brasil é hierárquico,
O “sabe com quem está falando?” e a educação superior privada no Brasil: Paradoxos e dilemas para uma interpretação crítica
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familista, patrimonialista e aprova tanto o “jeitinho” quanto um amplo leque
de comportamentos similares (ALMEIDA, 2007, p. 275).
Inicialmente, parece que o “sabe com quem está falando?” pode ser facilmente
apreendido, em especial no âmbito do ensino superior privado no Brasil, na medida em que se
pensa nas relações comerciais e econômicas provindas desse campo. Essa análise é evidenciada
nesse rito de autoridade por meio de expressões como “eu estou pagando” por parte dos alunos,
ou “eu não dou aula, eu vendo aulapelos professores, além de práticas institucionais como “dê
mais uma chance a ele” (uma prática comum entre coordenadores de curso pressionados pela
instituição para proteger seus alunos-clientes).
O intenso apelo econômico possibilita análises a partir de noções que consideram a
divisão de classes sociais e suas consequências e lutas. No entanto, sem negligenciar essa
análise crucial derivada da perspectiva materialista histórica dialética, o presente estudo
fundamenta-se em autores que utilizam diversas fontes e compartilham a valorização de
diferentes formas de interpretação e análise social. Busca-se evitar uma filiação teórica
exclusiva a uma única linha de pensamento, uma vez que essa abordagem parece ter sido
amplamente adotada no cenário educacional brasileiro.
O “sabe com quem está falando?” é rito que transcende essa relação econômica para
escancarar realidades e dilemas, paradoxos e arranjos surpreendentes e instigantes que não
dependem diretamente de classe. Esses ritos não ilustram exclusivamente uma hierarquia
piramidal entre classes sociais abastadas e desfavorecidas economicamente. É na perplexidade
encontrada nas relações sociais no Brasil que as teorias sobre a estrutura social, mesmo
oferecendo possibilidades diversas de análise, tornam-se insuficientes quando desconsideram
os esforços em interpretar e aprofundar o estudo da cultura.
Nesse contexto, a hierarquia parece fundamentar-se mais na intimidade social e em
relações que adquirem uma tonalidade pessoal, definindo-se no plano de uma moralidade forte
e duradoura. Essa perspectiva é destacada por DaMatta:
Em outras palavras, os casos de aplicação do “sabe com quem está falando?”
revelam uma estrutura social em que as classes sociais também se comunicam
por meio de um sistema de relações entrecortadas (cf. Gluckman, 1965) que,
provavelmente, termina por inibir parcialmente os conflitos e o sistema de
diferenciação social e político fundado na dimensão econômica do sistema.
Numa sociedade assim constituída, em que as relações de trabalho se somam
a um conjunto de laços pessoais regidos por valores como a intimidade (cf.
Barret, 1972), a consideração, o favor (cf. Schwartz, 1977), o respeito (cf.
Viveiros de Castro, 1974) e apreciações éticas e estéticas generalizantes
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(como as categorias de limpo, bem apessoado, correto, sagaz, bom, de fino
trato, etc.) existem possibilidades para uma hierarquização contínua e múltipla
de todas as posições no sistema, mesmo quando são radicalmente
diferenciadas ou formalmente idênticas (DAMATTA, 1997b, p. 192).
Frente ao conflito, conforme afirmado por DaMatta, experimenta-se apreensão, perde-
se o equilíbrio e fica-se sem saber como agir. Um rito autoritário sempre coloca as pessoas em
situações conflituosas. As relações entre professores e alunos, e vice-versa, nos dias atuais,
oferecem novas possibilidades de análise desse ponto de vista.
Em uma sociedade, a crise pode revelar que algo está em desordem e precisa ser
modificado ou corrigido; em outra, representa o fim de uma era, uma catástrofe. No Brasil, os
conflitos são concebidos como prenúncios do apocalipse e como fraquezas, o que, em parte,
nos impede, na teoria, de estudar ou debater sobre o assunto. Em nome de uma suposta paz,
evita-se contrariar alguém, debater ou criar problemas. Essa posição é defendida por DaMatta:
O “sabe com quem está falando?” e podemos dizer isso sem receio de
cometer um curto circuito sociológico é um instrumento da sociedade em
que as relações pessoais formam o núcleo daquilo que chamamos de
“moralidade” (ou “esfera moral”), e tem um enorme peso no jogo vivo do
sistema, sempre ocupando os espaços que as leis do Estado e da economia não
penetram. A fórmula “sabe com quem está falando?” é, assim, uma função da
dimensão hierarquizada e da patronagem que permeia nossas relações
diferenciais e permite, em consequência, o estabelecimento de elos
personalizados em atividades basicamente impessoais (DAMATTA, 1997b,
p. 195).
A discussão pode ser reveladora de igualitarismo individualista e, portanto, deve ser
combatida na medida em que se choca com nosso esqueleto hierarquizante. Em um sistema
dominado pela totalidade que conduz a um pacto entre fortes e fracos (DAMATTA, 1997b),
pode-se encontrar, dentro da relação entre superior e inferior, a ideia de consideração como
valor fundamental.
A percepção do conflito deixa de ser um sintoma de crise no sistema para ser
interpretada como uma revolta que deve ser reprimida e considerada fora de lugar. A crise, que
poderia gerar mudanças no panorama, é minimizada, e o conflito, embora conturbado, é
preferível. Além disso, surge um aspecto preocupante na educação relacionado à lógica católica
latina que enxerga a necessidade de intermediação diante de problemas. Nesse contexto
educacional, o professor é rotulado como o “sabe tudo”, resultando em uma terceirização
constante do esforço para aprender.
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Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
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O “sabe com quem está falando” não pode nem deve ser tomado como uma atualização
de valores e princípios estruturais da sociedade, mas, sim, como manifestação de traços pessoais
e indesejáveis. Parece que tudo ecoa dentro do que se pode prever, mantendo as coisas como
estão, e ironicamente as hierarquias como devem ser. Esse ritual assemelha-se ao racismo e ao
autoritarismo. O sistema revela imbricações culturais visíveis, embora frequentemente não
sejam reconhecidas por seus membros. No contexto educacional, todos aprendem desde cedo o
que é apropriado ou não, mas, na prática, cada situação sugere uma abordagem diferente.
A complexidade da análise do “sabe com quem está falando?” como rito social na
educação superior privada torna-se evidente ao ser uma expressão aparentemente recorrente,
mas constantemente negada. Assim como o preconceito, que é considerado indesejável, mas se
manifesta em situações específicas. Grande parte do fatalismo presente na mentalidade
brasileira e da busca incessante por uma melhor posição, mesmo sem perspectivas, alimenta a
célebre frase “eu sou brasileiro e não desisto nunca”. Esta frase, entoada constantemente, reflete
a manutenção de um sistema onde predominam a pessoalidade e a hierarquização. Na
universidade, objeto das elites brasileiras, essa cultura se combina com a cultura da rua, da casa
e do trabalho, multiplicada pelos professores e pelas instituições, empenhadas em ampliar seus
recursos e bolsas por meio de boas relações, amizades e parcerias, respaldadas por leis
fundamentadas na defesa da propriedade privada e na manutenção do status quo.
Paradoxos da cultura educacional no Brasil
A cultura expressa elementos afirmativos de sua autenticidade e criatividade, bem como
elementos deletérios e restritivos para o desenvolvimento autônomo da sociedade, inclusive na
formação de seus membros como personalidades equilibradas (RIBEIRO, 1975). Reflete a
experiência prévia da sociedade, assim como suas características estruturais.
No Brasil, por necessidades próprias da Ordem e por necessidades de
exercício do mister da conversão, especializam-se ainda na tarefa do ensino e
montam para isso, com pertinácia singular, a estrutura que, por dois séculos e
meio, assegurou a transmissão sistemática da cultura. Essa estrutura
desenvolveu-se em dois planos: o das escolas de ler, escrever e contar, visando
às crianças, e dos colégios, visando aos adolescentes. Aquelas foram
apresentadas como voltadas para os columins, mas a verdade é que - e não
poderia ser de outra maneira acolheu os filhos dos senhores. Foram estes os
que receberam, com colégios, o ensino jesuítico. Ora, esse ensino se
caracterizava pela alienação, e essa alienação, no caso do Brasil, acrescenta à
transplantação historicamente necessária, nessa fase inicial, como ficou dito
uma dimensão nova. “Ensino destinado a formar uma cultura básica, livre e
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desinteressada, sem preocupações profissionais, e igual, uniforme em toda
extensão do território” – definiu-o Fernando de Azevedo. [...] Tratando-se de
uma cultura neutra do ponto de vista nacional (mesmo português),
estritamente ligada à cultura européia, na idade Média, e alheia a fronteiras
políticas, - como tinha de ser a cultura difundida por uma associação
essencialmente internacional, com o característico de verdadeira malícia
papalina’ – é certo que essa mesma neutralidade (se nos colocarmos do ponto
de vista qualitativo) nos impede de ver, nessa cultura, nas suas origens e nos
seus produtos, uma cultura especificamente brasileira, uma cultura nacional
ainda em formação (SODRÉ, 1970, p. 12-13).
Perceber a configuração das relações sociais (habitus) no âmbito das instituições,
considerando um modo específico de ser fundamentado em questões relevantes para fins
culturais educacionais, pode representar um caminho frutífero para transformar hábitos
imutáveis em reflexão crítica (instrumentalização, para BOURDIEU; PASSERON, 1975).
Se for considerada a perspectiva descrita por Sodré (1970) pela qual a educação formal
alcança a sociedade, é necessário refletir sobre sua incorporação ao contexto educacional como
um todo, com características que influenciam os eventos históricos. Desse compromisso, não
se espera alcançar verdades absolutas ou imutabilidade, ainda tão presentes nos modelos atuais,
mas, principalmente, a descoberta de características presentes na prática, nas quais as teorias
frequentemente se desviam.
Nesta análise, é relevante situar o tema de estudo em um contexto histórico e considerar
que a sociedade brasileira esteve, até recentemente, sob domínio colonial, formal ou
dissimulado. A colonização deriva diretamente do verbo latino colo (significado: cultivar,
morar). Em latim, significava “eu moro, eu ocupo a terra”, e, por extensão, eu trabalho, eu
cultivo o campo. Um herdeiro antigo do colo é incola, o habitante; outro é inquilinus, aquele
que reside em terra alheia (BOSI, 1992, p. 11). No entanto, o verbo “colo” significa igualmente
tomar conta de cuidar, mandar, querer bem a, proteger. Do supino cultum deriva o particípio
futuro culturus (o que vai trabalhar, cultivar), aplicando-se tanto ao cultivo da terra quanto ao
trabalho de formação humana, acepção em que esse termo latino traduzia o vocábulo grego
Paidéia (SAVIANI, 2008). O que se viu aqui, na verdade, foi o [...]
[...] processo que abarcou de forma articulada, não homogênea ou harmônica,
antes dialeticamente, esse três momentos representados pela colonização
propriamente dita, ou seja, a posse ou exploração da terra subjugando seus
habitantes (os íncolas); a educação enquanto aculturação, isto é, a inculcação
nos colonizados das práticas, técnicas, símbolos e valores próprios dos
colonizadores; e a catequese entendida como a difusão e conversão dos
colonizados à religião dos colonizadores (SAVIANI, 2008, p. 29).
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Esses momentos são ainda visíveis nos dias atuais, como efeito de reprodução,
manifestando-se nas salas de aula por meio das práticas das instituições, embasadas no modelo
de formação dos docentes, na estrutura das instituições privadas e nas realidades sociais dos
estudantes. Estes, desempenhando um papel determinante na construção histórica, perpetuam e
impulsionam práticas herdadas de um passado não tão distante.
É verdade que a parcela menor, historicamente privilegiada com acesso ao ensino
baseado em padrões europeus, ainda acredita incorporar parte da Europa em seu modo de vida,
vestimenta, vocabulário e posturas. Este fenômeno reflete um país onde, na prática, o
patrimonialismo persiste, agora de forma modernizada. A diferença é que, nos dias atuais, a
docilidade do estudante é obtida sem o uso da força física, mas, de maneira não menos
impactante, os símbolos e os habitus determinam as continuidades e os absurdos.
Paulo Freire (2000) diz que “o ser humano que, fazendo a história, nela se faz, conta
não só a sua, mas também a dos que apenas a têm (p. 120)”. E ainda:
Uma das diferenças fundamentais entre o ser que intervém no mundo e o que
puramente mexe no suporte é que, enquanto o segundo se adapta ou se
acomoda ao suporte, o primeiro tem na adaptação um momento apenas do
processo de sua permanente busca de inserção no mundo. Adaptando-se à
realidade objetiva, o ser humano se prepara para transformá-la. No fundo, esta
“vocação” para a mudança, para intervenção no mundo, caracteriza o ser
humano como projeto, da mesma forma que sua intervenção no mundo
envolve uma curiosidade em constante disponibilidade para, refinando-se,
alcançar a razão de ser das coisas. Esta vocação para intervenção demanda um
certo saber do contexto com o qual o ser relaciona ao relacionar-se com os
outros seres humanos e ao qual não puramente contacta como fazem os outros
animais com o seu suporte. Demanda igualmente objetivos, como uma certa
maneira de intervir ou de atuar que implica uma outra prática: a de avaliar a
intervenção (FREIRE, 2000, p. 120).
A identidade daquele que busca formação é construída desde o momento da escolha do
curso, nos espaços institucionais, conferindo dimensões de tempo, espaço e cultura ao sujeito.
Fundamentada em saberes profissionais e nas atribuições éticas e deontológicas, a identidade
profissional está em constante transformação, embora os processos inovadores muitas vezes se
apoiem em padronizações, uniformidade, controle burocrático e planejamento centralizado
(VEIGA, 2009). Assim, quando as mudanças seguem lógicas de rearticulação do sistema
predominante, representando apenas a adoção acrítica do novo como velho, ocorre a
perpetuação do status quo, conceito que Bourdieu e Passeron (1975) chamariam de manutenção
do habitus, classificando-o como reprodução social.
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Segundo Veiga (2009), os planos de ensino transparecem concepções didáticas pela
ótica da inovação técnica, fortalecendo a formação docente descontextualizada que visa tão
somente habilidades técnicas. Destaca que os planos evidenciam que:
Não se ressalta a importância da didática para a formação docente; a prática
não é encarada como o ponto de partida para os estudos didáticos, mas é vista
como um campo neutro sobre o qual se aplicam regras para obtenção de
resultados previstos e controlados; concepções de educação e formação
docente são elaboradas numa lógica centrada na técnica, isto é, no “como
fazer”; o ensino, objeto de estudo da didática, não é compreendido como
prática social concreta e passa a assumir a resolução de problemas como uma
ação mensurável (VEIGA, 2009, p. 33-34).
Formar (do latim formare) significa dar forma, colocar-se em formação, desenvolver
uma pessoa. É preciso refletir e questionar os vieses que reprimem iniciativas de renovação da
sensibilidade, da criatividade, do novo, da inventividade. Se exige dos docentes e dos discentes
universitários indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão fazem parte dessa exigência
integradora a produção e a socialização do conhecimento (VEIGA, 2009). Socializar o
conhecimento é também permitir que a crítica e os debates sejam geradores e não meramente
reprodutores.
Em nossa sociedade, a crítica, o debate e a oposição à indagação estão associados ao
inquérito, conforme destacado por DaMatta (1997b), uma forma de processamento jurídico
acionado quando suspeita de crime ou pecado, de modo que a pergunta deve ser evitada. É
bem evidenciada tal situação em sala de aula quando, clamando pela participação, os debates
por vezes recaem em questões pessoais e animosidades, quase incontroláveis. Seria, às vezes,
quase como provocar uma “guerra”, guardadas as devidas proporções, instigar debate entre
alunos e professores. Continua DaMatta (1997b, p. 196-197):
Sem a interrogação, a vida social parece correr no seu fluxo normal, de modo
que é possível postular uma provável ligação entre o temor das formas
interrogativas e as sociedades preocupadas com a hierarquia, onde
normalmente tudo deve estar no seu lugar. A pergunta em tais sistemas pode
configurar uma tentativa de tudo revolucionar, detendo (ou suspendendo) a
rotina santificada do sistema. Dentro da mesma lógica, somos socializados (na
família e na escola) aprendendo a não fazer muitas perguntas. Seja porque isso
é indelicado, seja porque é considerado um traço agressivo que somente deve
ser utilizado quando queremos “derrubar” alguém.
Quando se observa alunos que buscam títulos com o objetivo de concluir rapidamente
o processo de formação, e o término do período de graduação, mestrado ou doutorado é
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percebido como uma vitória e alívio, torna-se necessário compreender por que isso ocorre,
considerando as demandas da educação permanente. No caso das instituições privadas, o
agravante do clientelismo, que exige a conclusão mediante o pagamento em dia das
mensalidades.
A chegada ao ápice da escalada em direção aos capitais intelectuais e simbólicos não
deve ser encarada como um fim, mas como um ponto de partida para um contínuo
desenvolvimento. Acreditar estar no auge do capital intelectual, infelizmente, parece ser
suficiente para legitimar posições que acabam por simplificar e reproduzir. Conforme expresso
por Roberto DaMatta (1997b), “em detrimento de lidar com nossos problemas, privilegiamos
nossas vertentes mais universalistas e cosmopolitas, o que implica que deixemos de lado uma
visão genuína dos problemas (p. 184)”. O eurocentrismo, encontrado nas análises sociológicas
e educacionais, tem, constantemente, reprimido interpretações que considerem a realidade
social brasileira como fator importante nas análises teóricas acadêmicas. Para gerar
instrumentos de mudança para os agentes sociais, é necessário compreender o habitus e os
campios nos quais a sociedade brasileira está fundamentada. A busca pode ser pela
compreensão de si mesma, a fim de construir uma mudança efetiva a partir desse entendimento.
A relação entre professor e aluno, bem como vice-versa, não se desenvolve por acaso,
assemelhando-se ao que os teóricos da sociologia brasileira propuseram estudar, ou conforme
a perceptiva cuidadosa de Paulo Freire captou em suas análises sagazes sobre o contexto
educacional dos excluídos no Brasil. A enorme contribuição desses autores, entre tantos outros,
carece de urdidura teórica mais cuidadosa. Como resultado dessa conexão, poderão manifestar-
se vieses instigantes e fundamentais a processos de formação, práticas e compreensão da
educação atual. Talvez, o pouco investimento nas teorias sociológicas do Brasil decorra dos
choques de realidade e das polêmicas encontradas no bojo de nossa formação social e cultural
e, quiçá, do desinteresse das classes dominantes.
É relevante observar que questões fundamentais de nossa formação foram e continuam
sendo pouco discutidas e compreendidas, e a condição de povo de segunda classe a que fomos
submetidos não transparece de maneira significativa no cotidiano. Talvez por vergonha de
assumir essa condição (sempre que possível maquiada e exposta de forma astuta) ou por
incorporarmos e reproduzirmos o modelo educacional e cultural como “bons alunos”.
O “jeitinho brasileiro”, a notável dificuldade de separar o público do privado, nossa
tendência ao personalismo, a omissão em lidar com os preconceitos (que muitas vezes é
desencorajada) e a desafiadora tarefa de lidar com as hierarquias, somadas à nossa jovem
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democracia, proporcionam uma complexificação na compreensão das relações em todos os
âmbitos de nossa sociedade, e possivelmente, da sociologia da educação. Conforme observado
por Holanda (1995, p. 61):
Em sociedade de origens tão nitidamente personalistas como a nossa, é
compreensível que os simples vínculos de pessoa a pessoa, independentes e
até exclusivos de qualquer tendência para a cooperação autêntica entre os
indivíduos, tenham sido quase sempre os mais decisivos. As agregações e
relações pessoais, embora por vezes precárias, e, de outro lado, as lutas entre
facções, entre famílias, entre regionalismos, faziam dela um todo incoerente e
amorfo. O peculiar da vida brasileira parece ter sido, por essa época, uma
acentuação singularmente energética do afetivo, do irracional, do passional, e
uma estagnação ou antes uma atrofia correspondente das qualidades
ordenadoras, disciplinadoras, racionalizadoras. Quer dizer, exatamente o
contrário do que parece convir a uma população em vias de organizar-se
politicamente.
O personalismo na formação social e, na prática, docente deixa marcas profundas
desencadeadoras de situações importantes na análise teórica psicossocial. Reafirmações de
habitus, disposição nos campos e reprodução social são conceitos fundamentais para desvelar
tais complexidades. Desde a autoridade, ora requerida através do discurso, manifesta pela
vestimenta, pela entonação de voz, até pela simpatia, o personalismo é engrenagem funcional
do modelo de ensino das instituições. Atingir status de patrono da cadeira pode significar
continuidade e garantia, revelando lado irrevogável do ponto de vista personalista.
Analogicamente, mais das vezes, reproduzimos costume de chamar mandatos estatais
pelo nome do governante, a lembrar de planos econômicos e fatos marcantes pelo nome do
protagonista. Por outro lado, associar a figura própria ao insucesso, proveniente de múltiplas
condições possíveis, é assumir consequências nefastas de cunho individual. Bourdieu analisa
com perspicácia os reflexos de ser um forasteiro, integrante de grupos excluídos, em meio às
mazelas acadêmicas reprodutoras.
Ao tratar do dilema brasileiro, Roberto DaMatta (1997b) afirma que, por vezes, somos
punidos pela tentativa de fazer cumprir a lei ou pela nossa ideia de que vivemos num universo
realmente igualitário (p. 216). Ao analisar a expressão “sabe com quem está falando?”, utilizada
no cotidiano social brasileiro, aponta para um aspecto de oposição dramática altamente
significativa de duas éticas:
Uma delas é uma “ética burocrática”; a outra, uma “ética pessoal”. De fato,
quando uma regra burocrática, universalizante e impessoal perde sua
racionalidade diante de alguém que alega um laço de filiação, casamento,
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amizade ou compadrio com outra pessoa considerada poderosa dentro do
sistema, estamos efetivamente operando com uma situação muito complexa.
Pois de um lado temos uma moral rígida e universal das leis ou regras
impessoais que surgem como uma feição modernizadora e individualista e são
postas em prática para submeter a todos os membros da sociedade. E, do outro,
temos a moralidade muito mais complicada das relações totais impostas pelos
laços de família e teias de relações sociais imperativas, em que a relação
pessoal e a ligação substantiva permitem pular regra ou, o que dá no mesmo,
aplicá-la rigidamente. Como diz o velho e querido ditado brasileiro ‘aos
inimigos a lei, aos amigos, tudo’ (DAMATTA, 1997b, p. 217).
Evidencia-se aqui a habilidade de se evitar a igualdade perante a lei e o consequente
tratamento individualizado (DAMATTA, 1997b). Os parâmetros hierárquicos na educação
(habitus docente) desempenham importante aspecto de análise sobre os quais muitos autores se
debruçam. Considerar características culturais específicas valoriza a compreensão da cultura e
aproxima a teoria da realidade omitida. O currículo educacional, por exemplo, apresenta-se
como possibilidade de questionamento, ao considerar a estruturação do sistema educacional
brasileiro
6
e do próprio currículo na disputa pelos conteúdos, modelos, línguas, histórias,
teorias, valores e comportamentos a serem selecionados e representados. A esse quadro, alia-se
a tendência de se analisar “[...] formas de conhecimento como a literatura, as artes, a filosofia
e as ciências próprias das sociedades europeias como superiores em relação aos seres humanos,
culturas e civilizações das outras regiões do mundo” (PRAXEDES, 2008, p. 2).
Quanto à competência política dos colonizadores em levantar entraves ao
desenvolvimento da cultura intelectual no Brasil, destaca-se que a
[...] transmissão da cultura se processa através de meios sistemáticos e de
meios não sistemáticos; o meio sistemático mais usado e mais desenvolvido é
a forma de educação denominada ensino; em todos os tempos e em todos os
lugares, com desenvolvimento que acompanhou o desenvolvimento das
sociedades, existiu sempre, maior ou menor, um aparelho de transmissão
sistemática de conhecimentos, uma estrutura do ensino; sociedades
complexas, como as do capitalismo, demandam complexos aparelhos de
ensino, estruturas complexas de ensino; tais aparelhos e estruturas são, no todo
ou em parte, peças do aparelho de Estado; transmitem, assim, a cultura oficial,
aquela que obedece à característica social de que a cultura dominante é a
cultura de classes dominantes. Na consideração do problema da Universidade,
no Brasil, destaca-se, em primeiro lugar, o aspecto de privilégio em que se
constituiu o ensino superior, alcançando parcela ínfima dos jovens (SODRÉ,
1970, p. 112-113).
6
Para Saviani (2008), não existe um sistema educacional brasileiro, mas a estrutura, sendo a partir das estruturas
que a construção de um sistema poderá ocorrer. Segundo o autor, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDB, não preenche as condições e características próprias da noção de sistema. E a utilização da expressão
“sistema”, seja ela adjetivada como educacional, escolar ou de ensino, para se referir à educação brasileira, ocorre
em função do termo “sistema” apresentar-se como um pressuposto, um “termo primitivo” (p. 110).
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Fica evidente que governo após governo, o projeto educacional do ensino superior pode
evoluir e trazer alterações no número de vagas e no percentual de pessoas acessando as
faculdades e universidades brasileiras (em especial as privadas), para mais e para menos. Ocorre
que não se na prática a preocupação efetiva e evidente de que elas fazem realmente um
trabalho que trará mudanças reais. Prova disso é o crescimento das instituições privadas e o
que, em sua maioria, entregam para as comunidades e a sociedade em geral. É muito pouco
frente as concessões e autorizações que recebem, para dizer o mínimo.
Considerações finais
O ensino superior se evidencia, ainda, decisivo na busca pelo aumento de capital
simbólico, econômico e social
7
. O percentual salarial de pessoas com mais de 15 anos de estudo
revela uma enorme diferença entre aqueles que estudam mais e aqueles que não estudam ou
têm menos anos dedicados aos estudos. Mesmo que as pesquisas revelem que a diferença
salarial após a pandemia tenha diminuído em relação aos que tem menos anos de estudo, ainda
é possível verificar enorme diferença entre eles, conforme mostra o trabalho dos economistas
Veloso, Filho e Peruchetti (2022) da FGV-IBRE
8
.
No entanto, é necessário considerar que o crescente contingente de demandantes ao grau
máximo de apreciação por parte da sociedade (status) é maior do que o verdadeiro número de
lugares disponíveis para todos eles. Trata-se de recursos escassos. Da população brasileira de
203.062.512 pessoas segundo o Censo Demográfico (IBGE, 2023), apenas 9.443.597 milhões
cursam o Ensino Superior (Censo da educação superior do INEP, 2021). Desses estudantes,
estão no ensino superior privado 7.367.080 milhões.
As instituições de ensino privadas (mas não elas) se preocupam, por um lado, em
formar alunos capazes de executar as tarefas técnicas e específicas com proficiência. Com o
passar do tempo, percebem, também, a necessidade de formar cidadãos e pessoas que saibam
viver em sociedade de maneira democrática e civilizada, nos moldes propostos pelas classes
dominantes, obedecendo rigidamente a seus pressupostos. Um dos paradoxos da modernidade
7
Segundo a interpretação de Bonnewitz, “À primeira análise, a noção de capital está ligada à abordagem
econômica. A analogia se explica pelas propriedades reconhecidas do capital: ele se acumula por meio de
operações de investimento, transmite-se pela herança, permite extrair lucros segundo a oportunidade que o seu
detentor tiver de operar as aplicações mais rentáveis. Estas características fazem dele um conceito heurístico se,
como faz Bourdieu, seu uso não é limitado apenas à área econômica. Efetivamente, é possível distinguir quatro
tipos de capital: econômico, cultural, social e simbólico” (BONNEWITZ, 2003, p. 53).
8
Impactos da educação no mercado de trabalho” no Observatório da Produtividade Regis Bonelli FGV (2022).
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líquida
9
é ter de aprofundar os conhecimentos sobre humanidade, como se não fôssemos
humanos. Nossa sociedade ensina aos indivíduos sobre autossuficiência, e, ao mesmo tempo,
delimita os caminhos pelos quais irão passar seus desejos e vontades.
A estrutura mental que a sociedade oferece, de uma antítese entre uma
individualidade inata e uma sociedade “externa”, serve então para explicar
fenômenos que, na realidade, são produto de discrepâncias dentro da sociedade,
do desencontro entre a orientação social do esforço individual e as
possibilidades sociais de consumá-lo (ELIAS, 1994, p. 121).
A dificuldade de alcançar parâmetros reguladores (se é que isso é possível e desejável
quando o hábitus nos incapacita para tanto), no entanto, ocorre não porque a convivência
nas sociedades complexas é também difícil, mas fundamentalmente porque a harmoniosidade
dessas relações se atinge (e para grupo seleto de pessoas) quando as metas socialmente
elaboradas conseguem ser realizadas. Isso torna o processo de ensino atualmente mais
complexo e aumenta, significativamente, o dever das instituições de ensino no que diz respeito
a sua responsabilidade social e seu real papel na formação. Além disso, destaca Pereira (2020,
p. 78):
Com intuito de estimular essa lógica na educação, as regras mercantis,
segundo Barroso (2004), fazem adequação dos objetivos educacionais aos
critérios de eficácia definidos pela concorrência e pela competição,
fundamentados por pressupostos que atribuem à formação um papel relevante
para subsidiar as necessidades do sistema produtivo e da riqueza. Isso tem
provocado um enfraquecimento na concepção de educação como um valor de
bem-estar social. Esse enfraquecimento, observado no interior das
universidades, tem gerado novas formas de organização pedagógica e cria,
assim, uma compatibilização calcada nas orientações de novos modos de
regulação das políticas educacionais, adota o modelo de gestão empresarial e
promove medidas, com tendências privatizantes, nos Centros de Ensino, nas
Coordenações de Cursos, nos Departamentos e nos Setores de Pesquisas.
Percebe-se, na prática, de forma cada vez mais acentuada, a presença de
valores de competição, de concorrência, de excelência econômica e de
flexibilidade, comprovando a existência de uma acentuada relação unilateral
entre educação e mercado.
A necessidade de efetivar mudanças no cenário educacional implica na ampliação dos
debates. Abordar questões sensíveis relacionadas aos processos de aprovação e autorização de
9
Bauman se refere, aqui, a uma sociedade onde a “versão individualizada e privatizada da modernidade, e o peso
da trama dos padrões e a responsabilidade pelo fracasso caem principalmente sobre os ombros dos indivíduos.
Chegou a vez da liquefação dos padrões de dependência e interação. Eles são agora maleáveis a um ponto que as
gerações passadas não experimentaram e nem poderiam imaginar; mas como todos os fluidos, eles não mantêm a
forma por muito tempo. Dar-lhes forma é mais fácil que mantê-los nela” (BAUMAN, 2001, p. 14).
João Nicodemos Martins MANFIO
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cursos, à responsabilidade social efetiva para com as comunidades onde as instituições estão
inseridas, à honestidade intelectual e à formação dos mestres e coordenadores, aos salários dos
professores e às condições de trabalho oferecidas em todos os aspectos. Tais paradoxos
caracterizam a educação superior privada no Brasil, apresentando desafios que aguardam
soluções corajosas e destemidas.
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João Nicodemos Martins MANFIO
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CRediT Author Statement
Reconhecimentos: Agradecimento especial à profa. Dra. Ione Ribeiro Valle do
Departamento de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina
líder do Laboratório de Pesquisas Sociológicas Pierre Bourdieu (LAPSB - CNPq) e todos
os membros desse grupo de pesquisa, pois os debates e as parcerias provindos desse
programa, contribuíram para o desenvolvimento e a construção das ideias desse artigo.
Agradecimento, também, aos membros do Núcleo de Estudos de Sociologia
Contemporânea: Zygmunt Bauman (NESC - CNPq), do Centro Universitário Unisociesc,
pois ao longo desses anos tem inspirado artigos, debates e discussões que possibilitam o
desenvolvimento de artigos como esse.
Financiamento: Não houve financiamento.
Conflitos de interesse: Não há conflitos de interesse.
Aprovação ética: Não precisou de aprovação ética.
Disponibilidade de dados e material: Não aplicável.
Contribuições dos autores: O autor debateu nos grupos de pesquisa, desenvolveu pesquisa
bibliográfica e escreveu o artigo.
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
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DO YOU KNOW WHO YOU'RE TALKING TO? AND PRIVATE HIGHER
EDUCATION IN BRAZIL: PARADOXES AND DILEMMAS FOR A CRITICAL
INTERPRETATION
O “SABE COM QUEM ESTÁ FALANDO?” E A EDUCAÇÃO SUPERIOR PRIVADA NO
BRASIL: PARADOXOS E DILEMAS PARA UMA INTERPRETAÇÃO CRÍTICA
¿SABE USTED CON QUIÉN ESTÁ HABLANDO? Y LA ENSEÑANZA SUPERIOR
PRIVADA EN BRASIL: PARADOJAS Y DILEMAS PARA UNA INTERPRETACIÓN
CRÍTICA
João Nicodemos Martins MANFIO1
e-mail: jnmmanfio@gmail.com
How to reference this paper:
MANFIO, J. N. M. Do you know who you're talking to? And private
higher education in Brazil: Paradoxes and dilemmas for a critical
interpretation. Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente
Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441. DOI:
https://doi.org/10.32930/nuances.v34i00.10262
| Submitted: 18/07/2023
| Revisions required: 22/10/2023
| Approved: 05/11/2023
| Published: 30/12/2023
Editors:
Prof. Dr. Rosiane de Fátima Ponce
Prof. Dr. Paulo César de Almeida Raboni
Deputy Executive Editor:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
1
UNISOCIESC University Center (UNISOCIESC), Joinville SC Brazil. Bachelor's degree in Social Sciences
from the University of Vale do Itajaí (UNIVALI). Master's in Political Sociology from the Federal University of
Santa Catarina (UFSC). Doctorate in Social Sciences - Anthropology from the Pontifical Catholic University of
São Paulo (PUC-SP). Postdoctoral research in Education at the Federal University of Santa Catarina (UFSC).
Coordinator of the Center for Studies in Contemporary Sociology: Zygmunt Bauman (NESC-CNPq).
Do you know who you're talking to? And private higher education in Brazil: Paradoxes and dilemmas for a critical interpretation
Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
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ABSTRACT: This work aims to establish a dialogue on private higher education in Brazil,
based on the anthropology of Roberto DaMatta. Through analyzing the author's ideas regarding
everyday situations and events in higher education, the goal is to highlight dilemmas and
paradoxes that need to be addressed. A proposed reflection introduces possible contributions
from Brazilian anthropology to educational phenomena in private higher education, prompting
the need to create alternatives and pose critical questions about existing practices in this context.
The analysis of the 'jeitinho' (finding a way), hierarchy, 'do you know who you're talking to?',
conservatism, and social rites aims to expand the notions commonly applied in understanding
educational phenomena.
KEYWORDS: Private higher education. Anthropology. Brazilian culture. Social rites.
RESUMO: Este trabalho tem como objetivo estabelecer um diálogo sobre a educação superior
privada no Brasil, fundamentado na antropologia de Roberto DaMatta. Através da análise das
ideias do autor acerca de situações cotidianas e eventos do ensino superior, busca-se destacar
dilemas e paradoxos que necessitam ser enfrentados. Propõe-se uma reflexão que introduz
possíveis contribuições da antropologia brasileira para os fenômenos educacionais no ensino
superior privado, instigando a necessidade de criar alternativas e realizar questionamentos
críticos sobre as práticas existentes nesse contexto. A análise do jeitinho, da hierarquização,
do “sabe com quem está falando?”, do conservadorismo e dos ritos sociais visa ampliar as
noções comumente aplicadas na compreensão dos fenômenos educacionais.
PALAVRAS-CHAVE: Educação superior privada. Antropologia. Cultura brasileira. Ritos
sociais.
RESUMEN: Este artículo pretende promover un diálogo sobre la enseñanza superior privada
en Brasil a partir de la antropología de Roberto DaMatta. Cotejando las ideas del autor sobre
situaciones y hechos cotidianos en la educación superior, buscamos señalar dilemas y
paradojas a ser enfrentados. Proponemos una reflexión que trae a colación posibilidades de
contribución de la antropología brasileña a los fenómenos educativos en la enseñanza superior
privada, provocando la necesidad de crear alternativas y cuestionar críticamente lo que se ha
hecho en esta área. Creemos que el análisis del "jeitinho", de la jerarquización, del "¿sabes
con quién estás hablando?", del conservadurismo y de los ritos sociales permite ampliar las
nociones usualmente aplicadas para la comprensión de los fenómenos educativos.
PALABRAS CLAVE: Enseñanza superior privada. Antropología. Cultura brasileña. Ritos
sociales.
João Nicodemos Martins MANFIO
Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
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Introduction
This article aims to provoke and broaden the debate of ideas in the field of private higher
education from the perspective of Roberto DaMatta's anthropology. If the ritual of authority
manifested in the expression "Do you know who you’re talking to?"
2
can be indicative of
Brazilian social life, could it also be a generative element for understanding the social practices
within the realm of private higher education? This is the starting question of this article and the
theme upon which the work will be developed and reflections constructed.
Roberto Augusto DaMatta (1984, 1993, 1997a, 1997b) has dedicated, and still
dedicates, his life to interpreting social rites and everyday practices in Brazil. From carnival
and Independence Day celebrations to the "jeitinho" (a way of getting things done) and street
smarts, religious processions, spaces within homes, streets, and workplaces, death, and more
recently, traffic, he has revealed important aspects of the so-called Brazilian social way of
being, providing insights for the analysis of other phenomena.
The experiences lived within the classroom context or even within its physical
environments in the realm of private higher education constitute the starting point for the
following considerations. Several passages from DaMatta's books (1984, 1993, 1997a, 1997b)
specifically refer to contexts of hierarchy, power struggles, and ways of resolving situations
(using the "jeitinho," asking "Do you know who you’re talking to"), positions and attitudes
towards criticismcultural characteristics that shape the Brazilian way of being and every day
realities brought from outside into the university.
It is not expected to use the detailed and descriptive perception of Brazilian daily life
provided by DaMatta's anthropological theory (1984, 1993, 1997a, 1997b) to understand or
develop reflections related to education. On the other hand, a significant portion of this
perception, contained in his works, can be frequently observed and experienced in classrooms,
closely aligning with what is presented in his books. The following will present crucial points
from this author's work, facilitating the analysis of everyday phenomena and enabling their
understanding through reflection focused on the field of education.
The intention is not to construct a thesis, as that would require depth befitting a more
extensive dissertation and empirical research. The purpose is to investigate the possibility of a
2
Roberto DaMatta's study addresses this theme in the chapter "Do you know who you’re talking to? An Essay on
the Distinction between Individual and Person in Brazil" in the book Carnavais, Malandros e Heróis: para uma
sociologia do dilema brasileiro (Carnivals, Rogues, and Heroes: Toward a Sociology of the Brazilian Dilemma)
(1997b).
Do you know who you're talking to? And private higher education in Brazil: Paradoxes and dilemmas for a critical interpretation
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dialogue between what DaMatta writes and the everyday context of private higher education.
By taking an uncommon path, as, until the present moment, no studies in this direction have
been identified, the aim is to provoke and encourage students and researchers in the field of
education to incorporate or deepen this Brazilian anthropological discussion in their research.
Subsequently, a bibliographic study will be developed with the aim of establishing a
connection between excerpts from DaMatta's work (1997b) and everyday situations in the
context of private higher education. Education authors such as Saviani (2008), Freire (2000),
Fernandes (1960), Veiga (2009), Bourdieu and Passeron (1975) are also presented with the
objective of grounding and supporting the theoretical construction. In the final considerations,
some questions are raised that relate to the insights gained from this kind of anthropology of
everyday school life, seeking to establish connections with the expected responsibilities
assigned to private higher education institutions.
Reflecting on the daily lives of students, teachers, and administrators immersed in the
anthropological phenomena described by DaMatta (1997b) and considering that these
phenomena make sense for analyzing reality, as believed, a series of questions arise that could
and should be viewed in the development of action plans, curricula, and even public policies in
the realm of private higher education.
Brazilian cultural dilemmas pointed out by DaMatta
In a society where inequality predominates and social relations are established in
multiple entanglements of cultural characteristics, disregarding anthropological observations
seems equivalent to neglecting a rich source of possibilities for analyzing and understanding
society and, consequently, the development of instruments for transforming reality.
In Brazil, several authors and scholars have dedicated their lives to interpreting the
country, and they often appear to have spoken and written in vain. It is assumed that as Florestan
Fernandes perceived when criticizing the education guidelines bill:
We confine ourselves to defending ideas and principles that have ceased to be
the subject of political discussion in more advanced countries. It is as if Brazil
were regressing almost two centuries in relation to the contemporary history
of those countries and as if we were compelled to defend the values of the
French Revolution vehemently! It is a situation that would be comical if its
consequences were not serious, which may arise from it. Our personal position
weighs on us as uncomfortable (FLORESTAN FERNANDES, 1960, p. 220,
our translation).
João Nicodemos Martins MANFIO
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This creates a sense of inauthenticity in the country's culture, leading to the importation
of portions of foreign culture assumed to be superior and imitated recklessly. It is necessary to
examine to what extent this actually occurs in the context of higher education and whether there
is a relationship between this "cultural transplantation" and the absence of an educational
system, especially in the specific case of this study, which addresses private higher education
in Brazil.
In Brazil, it is believed that higher education makes all the difference in terms of
intellectual and critical maturity. One can agree with this to some extent, as it is undeniable that
the practice of education brings about transformations in individuals, given the demands and
processes related to teaching and learning. However, this does not necessarily imply direct
assistance in the process of social mobility construction and practical contributions to reducing
inequality and strengthening democracy.
Manifestations that occur within classrooms, for example, related to punishment, racial
and economic quotas, homoaffective, economics, and politics, highlight the more perverse and
backward side of those who theoretically should propagate democratic and critical ideas. Either
the effect of the classroom and higher education is insufficient, or what is discussed there does
not bother us to the point of generating an agenda for social transformation.
In this context, DaMatta's anthropological reading (1997b) reveals that expressions like
"Do you know who you’re talking to?" and other relevant characteristics contradict the
Brazilian way of being by demonstrating proximity to formality and exposing prejudices
classified as veiled. These rituals elucidate a series of concepts and perceptions of DaMatta
(1997a) about Brazil, which can shed light on educational practices within institutions, such as
"jeitinho" (finding a way), trickery, patrimonialism, meritocracy, fatalism, hierarchy, and
personalism.
Hierarchical scales in Brazil, also evident in education, coexist and are visible but often
concealed by a layer of hypocrisy as if it were an unquestionable rule that establishes "each one
must know their place." The ritual of authority in question arises as a reminder, a reaffirmation
that represents the denial of the "jeitinho" (DAMATTA, 1997a) and cordiality (HOLANDA,
1995).
On the other hand, the "jeitinho" and trickery have stood out, going beyond mere
survival tools in a society that is still disorganized and in development. Alarmingly, these
practices emerge in political corruption scandals and misappropriation of state funds, resulting
in delays and disastrous consequences, especially for the most vulnerable population.
Do you know who you're talking to? And private higher education in Brazil: Paradoxes and dilemmas for a critical interpretation
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While, for various reasons, we are averse to formalism, at least in daily practices,
challenging the social law imposed by the dominant classes, some rituals manifest fascinating
paradoxes about how social relations unfold in a country where there is considerable concern
about social position and a notable awareness of the rules and resources related to the
maintenance, loss, or threat of these positions. DaMatta invokes Alexis de Tocqueville to
remind us that,
[...] In aristocratic communities, where a small number of people direct
everything, social interaction among men follows established conventional
rules. Everyone knows or thinks they know exactly the marks of respect or
attention they must show, and it is assumed that no one is ignorant of the
science of etiquette. The customs and practices established by the first class
of society serve as a model for all the others, each of which, in turn, establishes
its code, to which all its members are obliged to adhere. Thus, the rules of
politeness form a complex system of legislation, difficult to master perfectly,
but from which it is dangerous for anyone to deviate; hence, men are
constantly exposed to inflict or receive, involuntarily, bitter affronts
(DAMATTA, 1997b, p. 188, our translation).
From these observations, two problems emerge that contradict democratic logic,
specifically evident in the everyday environment of classrooms. The question "Do you know
who you’re talking to?" limits the progressive
3
initiatives of private school teachers since,
apprehensive about the reach of their speeches, they tend to avoid commitments, concerned
about the institutional outcomes of potential critical and transformative approaches.
Various reactions can be observed, ranging from pressures from institutional leadership
strategically defending political positions necessary for their economic survival to course
coordinators facing considerable pressure in the quest to create new classes every semester.
These pressures also extend to the students themselves, who rely on the "weapon" of
institutional faculty evaluation, which carries significant weight in the teaching careers and
subsequent salary increases of the professorial class.
It is also relevant to emphasize the pressure from the state, which sometimes
demonstrates concern about "improving" higher education indicators at any cost, resulting in
an unbridled and sometimes irresponsible pursuit of increasing the number of students in higher
3
Regarding progressive teachers, Paulo Freire states: "In my understanding, serious work, meticulous research,
and critical reflection around the dominant power that is gaining increasing dimensions have never been as
necessary as they are today. The activity of progressive intellectuals can never be that of someone who, recognizing
the strength of obstacles, either transforms them or takes them as irresponsible. That would be a fatalistic position
of accommodation, which has nothing to do with the task of progressives. For these individuals, taking obstacles
as challenges, the task is to seek appropriate responses to them" (FREIRE, 2012, p. 69, our translation).
João Nicodemos Martins MANFIO
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education courses. It is important to note that this is not about challenging policies for access
to higher education, which is admirable and necessary, including reducing social inequalities
so detrimental to our society. The criticism is directed towards the simplified pursuit of
numbers, disregarding the fundamental aspect of the entire process, which is the critical and
transformative development of society in its various aspects.
Roberto DaMatta himself articulated in his book O que faz o brasil, Brasil? (What
Makes brazil, Brazil?)(1984) the need to distinguish Brazil with a lowercase "b" from Brazil
with an uppercase "B." The former refers to criteria related to numbers and objective,
quantitative, and clear definitions aligned with classificatory models established by the West
after the French and Industrial Revolutions, as seen in the cases of the United States, France,
England, and Germany. On the other hand, Brazil, with an uppercase "B," is something
complex, rooted in culture, geographical location, the "piece of land paved with the warmth of
our bodies, home, memory, and awareness of a place to which one has a unique, wholly sacred
connection" (1984, p. 11-12, our translation). He further states:
It is an important discovery, I believe, to say that we have paid much more
attention to only one of these classificatory axes, wanting to discuss Brazil
only as a matter of modernity and its economy and politics; or, conversely,
reducing its reality to a problem of family, personal relationships, and
cordiality. For me, it is neither one nor the other, but both given
simultaneously and in a complex way. From this perspective, which is that of
this small book, the key to understanding Brazilian society is a dual key. On
the one hand, it is modern and electronic, but on the other, it is an old key
crafted over the years. It is typical of our system to have the ability to mix and
mate things that I have discussed in my work as a relational activity, to connect
and discover a central point (DAMATTA, 1984, p. 19, our translation).
Many teachers from various research and training centers had already internalized such
a mindset in their formation. This means that the conservative school has already caused them
enormous damage and marks that will be passed on throughout their careers to those around
them. Transformative initiatives tend to collide with the construction of their life history as
academics. A meeting of teachers often demonstrates such conservative positions in their usual
expressions regarding certain subjects. The experienced ritual of authority, shared below, harks
back to the propagation of panoptic control models by Foucault (2012) and the reproductive
mechanisms of Bourdieu and Passeron (1975)
4
.
4
The work of Bourdieu and Passeron, A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino, 1975
(Reproduction: Elements for a Theory of the Educational System, 1975), points out that in a given social
formation, legitimate culture, that is, the culture endowed with dominant legitimacy, is nothing other than the
Do you know who you're talking to? And private higher education in Brazil: Paradoxes and dilemmas for a critical interpretation
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If democracy presupposes equal rights, in this context, there is no isolated desire for
transformation or differentiated initiative that can survive for long. There is an overwhelming
tendency in conservative teaching that leads new initiatives to fall into disuse rapidly without
the need for confrontations, which become more and more isolated as the recurring pattern
establishes itself as predominant. In this space, the recurrence of arbitrariness among the
involved agents is inevitable. Paraphrasing a popular Brazilian saying: "cry less, do more!" The
power struggle for power and to retain power occurs unrestrained, each for themselves, once
again contradicting the democratic and constitutional logic that "all are equal before the law"
(BRASIL, 2016, p. 15, our translation), as established in Article 5 of the Brazilian Constitution.
The second problem arises from survival initiatives within these relationships and their
complexity. The "jeitinho" (finding a way) emerges as an unavoidable solution in social
relations. It is what blinds those who should not see in certain situations; it is with it that one
can sometimes achieve the unattainable, and without it, social life loses its charm and its reason.
In the Brazilian context, society values the practice of "jeitinho," which sets us apart, for
example, from the United States, where this approach is often disapproved.
In the situation at hand, the resolution of situations has chosen to follow the path of
informality and personal connections. "There is a remedy for all things but death," as another
Brazilian popular saying goes. Delays are justified for unquestionable reasons, salary increases
may occur for personal reasons, and the number of absences is relative, depending on factors
that must be considered. Grades can be reviewed based on plausible justifications that take
precedence over bureaucratic decisions, the teacher's evaluation may rely on their personal
relationship with the students, and bureaucracies and formalities are often set aside in favor of
harmony and maintaining each person in their place.
The problem-solving approach grounded in this logic is defended as a moral aspect of
Brazilian society. What Almeida (2007) calls society's "moral gray zone" is the supposedly
more logical way to resolve conflicts. Between the cold law and the rule that makes us equal,
there are friendships and situations where personal connections replace the law. Who resists a
friend's request? Or how not to help someone who once helped me? One hand washes the other,
and if I owe everything to my friends and enemies, the rigor of the law is applied. This complex
logic of social relations is permeated by inexplicable details in other countries, where rules
either function or do not exist, as DaMatta (1984) would say.
dominant cultural arbitrary, insofar as it is unknown in its objective truth as cultural arbitrary and dominant cultural
arbitrary.
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Social rituals manifest in societies' daily lives, in various contexts, and for different
reasons. It is particularly interesting to understand how these rituals specifically occur in the
context of private higher education. The analysis of education from classical perspectives has
become commonplace, and the results of these studies often align with expectations, as if they
were commissioned work with guaranteed delivery, although unwrapping this package does not
always represent satisfaction. Therefore, it becomes necessary to add a touch of reality and
proximity to everyday experience, respond to Brazilian theorists' calls, and study them more
thoroughly.
More than just revealing specific details, it is crucial to make efforts to understand and
interpret reality. In this sense, Brazilian theorists offer abundant material from field research
and in-depth studies of our culture. In particular, part of DaMatta's work (1997b), despite being
written in the 70s and 80s, can be considered timeless. This is evident when realizing that
practices analyzed by him still prevail in Brazilian daily life. Proof of this is Alberto Carlos
Almeida's book, titled "A Cabeça do Brasileiro" (2007), which, through meticulous research,
demonstrated that the questions proposed and analyzed by DaMatta throughout his career
continue to be evident and latent in our society. The author comments on DaMatta's work,
stating that:
[...] exploring some of its central concepts in our Brazilian Social Research.
We address different aspects of national life. From sexuality to corruption,
from the use of "jeitinho" to illegal punishments, from the idea of a
paternalistic State to the practice of racial prejudice. [...] Our research has
shown that Roberto DaMatta is essentially correct. Brazil is hierarchical,
familistic, and patrimonialistic and approves of the "jeitinho" and a wide range
of similar behaviors (ALMEIDA, 2007, p. 275, our translation).
Initially, it seems that "Do you know who you’re talking to?" can be easily grasped,
especially in the context of private higher education in Brazil, as one thinks about the
commercial and economic relationships arising from this field. This analysis is evidenced in
this ritual of authority through expressions like "I am paying" from the students or "I don't teach,
I sell classes" from the professors, as well as institutional practices like "give him another
chance" (a common practice among course coordinators pressured by the institution to protect
their student-clients).
The intense economic appeal allows for analyses based on notions that consider the
division of social classes and their consequences and struggles. However, without neglecting
this crucial analysis derived from the historical dialectical materialist perspective, the present
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study is grounded in authors who use diverse sources and share an appreciation for different
interpretations and social analysis forms. The aim is to avoid exclusive theoretical affiliation to
a single line of thought, as this approach has been widely adopted in the Brazilian educational
scenario.
The "Do you know who you’re talking to?" is a ritual that transcends this economic
relationship to expose realities and dilemmas, paradoxes, and surprising and intriguing
arrangements that do not directly depend on class. These rituals do not exclusively illustrate a
pyramidal hierarchy between economically privileged and disadvantaged social classes. In the
perplexity found in social relations in Brazil, theories about social structure, even offering
various possibilities for analysis, become insufficient when they disregard efforts to interpret
and deepen the study of culture.
In this context, hierarchy is more based on social intimacy and relationships that acquire
a personal tone, defining themselves in the realm of strong and enduring morality. DaMatta
highlights this perspective:
In other words, instances of the application of "Do you know who you’re
talking to?" reveal a social structure in which social classes also communicate
through a system of intersecting relationships (cf. Gluckman, 1965) that likely
partially inhibits conflicts and the system of social and political differentiation
founded on the economic dimension of the system. In a society so constituted,
where work relationships are added to a set of personal bonds governed by
values such as intimacy (cf. Barret, 1972), consideration, favor (cf. Schwartz,
1977), respect (cf. Viveiros de Castro, 1974), and generalizing ethical and
aesthetic judgments (such as the categories of clean, well-dressed, correct,
shrewd, pleasing, refined, etc.), there are possibilities for a continuous and
multiple hierarchization of all positions in the system, even when they are
radically differentiated or formally identical (DAMATTA, 1997b, p. 192, our
translation).
Faced with conflict, as stated by DaMatta, one experiences apprehension, loses balance,
and is unsure how to act. An authoritarian ritual always puts people in conflicting situations.
The relationships between teachers and students, and vice versa, in today's context offer new
possibilities for analysis from this perspective.
In one society, a crisis may reveal that something is in disorder and needs to be modified
or corrected; in another, it represents the end of an era, a catastrophe. In Brazil, conflicts are
conceived as harbingers of the apocalypse and as weaknesses, which, in part, theoretically
hinders us from studying or debating the subject. In the name of supposed peace, one avoids
contradicting someone, arguing, or creating problems. DaMatta advocates this position:
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The "Do you know who you’re talking to?"and we can say this without fear
of committing a sociological short circuitis an instrument of the society
where personal relationships form the core of what we call "morality" (or
"moral sphere"), and it carries immense weight in the lively play of the system,
always occupying the spaces that the laws of the State and the economy do
not penetrate. The formula "Do you know who you’re talking to?" is thus a
function of the hierarchized dimension and the patronage that permeates our
differential relations and allows, consequently, the establishment of
personalized links in impersonal activities (DAMATTA, 1997b, p. 195, our
translation).
The discussion can be revealing of individualistic egalitarianism and, therefore, must be
combated as it clashes with our hierarchizing skeleton. In a system dominated by totality
leading to a pact between the strong and the weak (DAMATTA, 1997b), one can find the idea
of consideration as a fundamental value within the relationship between superior and inferior.
The perception of conflict ceases to be a symptom of a crisis in the system and is
interpreted as a rebellion that must be repressed and considered out of place. The crisis, which
could generate changes in the landscape, is minimized, and the conflict, although turbulent, is
deemed preferable. Additionally, a concerning aspect arises in education related to the logic of
Latin Catholicism, which sees the need for intermediation in the face of problems. In this
educational context, the teacher is labeled as the "know-it-all," resulting in constant outsourcing
of the effort to learn.
The "Do you know who you’re talking to?" cannot and should not be taken as an update
of values and structural principles of society but rather as a manifestation of personal and
undesirable traits. Everything echoes within what can be predicted, maintaining things as they
are and, ironically, hierarchies as they should be. This ritual resembles racism and
authoritarianism. The system reveals visible cultural entanglements, although its members often
do not recognize them. In the educational context, everyone learns early on what is appropriate,
but in practice, each situation suggests a different approach.
The complexity of analyzing "Do you know who you’re talking to?" as a social ritual in
private higher education becomes evident as it is an apparently recurrent expression but
constantly denied. Just like prejudice, which is considered undesirable but manifests in specific
situations. Much of the fatalism present in the Brazilian mindset and the relentless pursuit of a
better position, even without prospects, fuel the famous phrase "eu sou brasileiro e não desisto
nunca" (I am Brazilian and never give up). This phrase, often chanted, reflects the maintenance
of a system where personal relationships and hierarchies prevail. In the university, the object of
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the Brazilian elites, this culture combines with the culture of the street, home, and work,
multiplied by teachers and institutions committed to expanding their resources and scholarships
through good relationships, friendships, and partnerships, supported by laws grounded in the
defense of private property and the maintenance of the status quo.
Paradoxes of Educational Culture in Brazil
The culture expresses elements affirming its authenticity and creativity, as well as
deleterious and restrictive elements for society's autonomous development, including in
forming its members as balanced personalities (RIBEIRO, 1975). It reflects the society's
previous experience and its structural characteristics.
In Brazil, driven by the needs of the Order and the exercise of the mission of
conversion, institutions specialized in the task of education and diligently
established the structure that, for two and a half centuries, ensured the
systematic transmission of culture. This structure developed on two levels:
that of schools for reading, writing, and arithmetic, targeting children, and
colleges targeting adolescents. The former was presented as being directed
towards the "columns," but the truth is, and it could not be otherwise, they
accommodated the masters' children. It was the latter who received Jesuit
education in these colleges. Now, this education was characterized by
alienation, and this alienation, in the case of Brazil, adds to the transplantation
historically necessary in this initial phase, as mentioned a new dimension.
"Education aimed at forming a basic, free, and disinterested culture, without
professional concerns, and equal, uniform throughout the territory, " defined
Fernando de Azevedo. [...] Being a culture neutral from a national perspective
(even Portuguese), strictly linked to European culture in the Middle Ages and
oblivious to political borders as the culture spread by an 'essentially
international association, with the characteristic of true papal malice' had to
be it is certain that this neutrality (if we take a qualitative perspective)
prevents us from seeing in this culture, in its origins and products, a
specifically Brazilian culture, a national culture still in formation (SODRÉ,
1970, p. 12-13, our translation).
Understanding the configuration of social relations (habitus) within institutions,
considering a specific way of being grounded in relevant issues for cultural and educational
purposes, can represent a fruitful path to transform immutable habits into critical reflection
(instrumentalization, according to BOURDIEU; PASSERON, 1975).
Considering the perspective described by Sodré (1970), in which formal education
reaches society, it is necessary to reflect on its incorporation into the overall educational
context, with characteristics that influence historical events. From this commitment, one does
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not expect to reach absolute truths or immutability, still so present in current models, but
primarily the discovery of characteristics present in practice, where theories often deviate.
In this analysis, it is relevant to place the subject of study in a historical context and
consider that Brazilian society has been, until recently, under colonial rule, whether formal or
disguised. Colonization is directly derived from the Latin verb "colo" (meaning: to cultivate,
dwell). Latin meant "I dwell, I occupy the land," and, by extension, I work, I cultivate the field.
An ancient heir of "colo" is "incola," the inhabitant; another is "inquilinus," one who resides on
another's land (BOSI, 1992, p. 11). However, the verb "colo" also means taking care of,
managing, wanting good for, and protecting. From the supine "cultum" derives the future
participle "culturus" (one who will work, cultivate), applying to both land cultivation and the
work of human formation, a sense in which this Latin term translated the Greek word "Paideia"
(SAVIANI, 2008). What we have seen here, in fact, was the [...]
[...] process that articulated, not homogeneously or harmoniously, but
dialectically, these three moments represented by colonization itself, i.e., the
possession or exploitation of the land subjugating its inhabitants (the
"incolas"); education as acculturation, i.e., the inculcation in the colonized of
the practices, techniques, symbols, and values of the colonizers; and
catechesis understood as the diffusion and conversion of the occupied to the
religion of the colonizers (SAVIANI, 2008, p. 29, our translation).
These moments are still visible today as a reproduction effect, manifesting in classrooms
through institutional practices based on the teacher training model, the structure of private
institutions, and the social realities of students. Playing a determining role in historical
construction, these students perpetuate and drive practices inherited from a not-so-distant past.
It is true that the smaller, historically privileged portion with access to education based
on European standards still believes in incorporating part of Europe into their way of life, attire,
vocabulary, and postures. This phenomenon reflects a country where, in practice,
patrimonialism persists, now in a modernized form. The difference is that, nowadays, student
docility is achieved without the use of physical force, but, in a no less impactful manner,
symbols and habitus determine continuities and absurdities.
Paulo Freire (2000) states that "the human being who, making history, is made by it,
tells not only his own but also the history of those who only have it (p. 120, our translation)”.
And further:
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One of the fundamental differences between the being who intervenes in the
world and the one who merely moves the support is that, while the latter adapts
or accommodates to the support, the former sees adaptation as just a moment
in the process of their ongoing quest for integration into the world. By
adjusting to objective reality, the human being prepares to transform it.
Essentially, this "vocation" for change, for intervention in the world,
characterizes the human being as a project, just as their intervention in the
world involves a curiosity in constant readiness to, by refining itself, reach the
raison d'être of things. This vocation for intervention demands a certain
knowledge of the context with which the being relates to other human beings
and to which it does not merely contact as other animals do with their support.
It also demands objectives, such as a particular way of intervening or acting
that implies another practice: evaluating the intervention (FREIRE, 2000, p.
120, our translation).
The identity of those seeking education is constructed from the moment of choosing a
course in institutional spaces, conferring dimensions of time, space, and culture to the
individual. Grounded in professional knowledge and ethical and deontological responsibilities,
professional identity is in constant transformation, although innovative processes often rely on
standardization, uniformity, bureaucratic control, and centralized planning (VEIGA, 2009).
Thus, when changes follow the logic of rearticulating the prevailing system, representing only
the uncritical adoption of the new as old, the perpetuation of the status quo occurs, a concept
that Bourdieu and Passeron (1975) would call the maintenance of habitus, classifying it as social
reproduction.
According to Veiga (2009), lesson plans reveal didactic conceptions from the technical
innovation perspective, reinforcing decontextualized teacher education that aims only at
technical skills. He emphasizes that the plans show that:
The importance of didactics for teacher education is not highlighted; practice
is not seen as the starting point for didactic studies but is viewed as a neutral
field upon which rules are applied to obtain predicted and controlled results.
Conceptions of education and teacher education are developed in a logic
centered on technique, that is, "how to do it." Teaching, the object of didactic
study, is not understood as a concrete social practice and comes to assume
problem-solving as a measurable action (VEIGA, 2009, p. 33-34, our
translation).
To educate (from the Latin formare) means to give shape, to enter into formation, and
to develop a person. It is necessary to reflect upon and question biases that repress initiatives
of renewing sensitivity, creativity, novelty, and inventiveness. The university demands from
both educators and university students the inseparability of teaching, research, and extension;
the production and socialization of knowledge are part of this integrative demand (VEIGA,
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2009). Socializing knowledge also means allowing criticism and debates to be generative rather
than reproductive.
In our society, criticism, debate, and opposition to inquiry are associated with the
inquisition, as highlighted by DaMatta (1997b), a form of legal proceedings triggered when
there is suspicion of crime or sin so that questioning should be avoided. This situation is evident
in the classroom when calling for participation, debates sometimes devolve into personal issues
and almost uncontrollable animosities. It would sometimes be almost like provoking a "war,"
with due proportions maintained, to incite debate among students and professors. DaMatta
(1997b, p. 196-197, our translation) continues:
Without question, social life flows in its normal course so that a probable
connection between the fear of interrogative forms and societies concerned
with hierarchy, where everything must generally be in its place, can be
postulated. In such systems, asking questions may constitute an attempt to
revolutionize everything, stopping (or suspending) the sanctified routine of
the system. By the same logic, we are socialized (in the family and school),
learning not to ask too many questions. Either because it is impolite or because
it is considered an aggressive trait that should only be used when we want to
"bring someone down".
When observing students seeking degrees to complete the education process quickly
and completing the undergraduate, master's, or doctoral period is perceived as a victory and
relief, it becomes necessary to understand why this occurs, considering the demands of lifelong
education. In the case of private institutions, there is the aggravating factor of clientelism, which
requires completion upon timely payment of fees.
Reaching the pinnacle of the ascent toward intellectual and symbolic capital should not
be seen as an end but as a starting point for continuous development. Believing to be at the peak
of intellectual capital seems sufficient to legitimize positions that simplify and reproduce. As
expressed by Roberto DaMatta (1997b), "To the detriment of dealing with our problems, we
privilege our more universalist and cosmopolitan aspects, implying that we leave aside a
genuine view of the problems (p. 184, our translation)". Eurocentrism, found in sociological
and educational analyses, has consistently suppressed interpretations that consider Brazilian
social reality to be an essential factor in academic theoretical analyses. To generate instruments
for change for social agents, it is necessary to understand the habitus and the fields upon which
Brazilian society is grounded. The quest may be for self-understanding to build effective change
from this understanding.
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The relationship between teacher and student, as well as vice versa, does not unfold by
chance, resembling what Brazilian sociology theorists proposed to study or, as Paulo Freire
carefully captured in his insightful analyses of the educational context of the excluded in Brazil.
The significant contribution of these authors, among many others, lacks a more careful
theoretical elaboration. As a result of this connection, intriguing biases fundamental to
educational processes, practices, and understanding of current education may manifest. The
limited investment in Brazilian sociological theories stems from the shocks of reality and
controversies found within our social and cultural formation and, perhaps, from the disinterest
of the dominant classes.
Fundamental issues of our formation have been and continue to be little discussed and
understood, and the condition of being a second-class people to which we have been subjected
does not significantly transpire in everyday life. Perhaps out of shame to assume this condition
(whenever possible masked and astutely exposed) or because we incorporate and reproduce the
educational and cultural model as "good students".
The "Brazilian way," the remarkable difficulty in separating the public from the private,
our tendency towards personalism, the omission in dealing with prejudices (which is often
discouraged), and the challenging task of dealing with hierarchies, combined with our young
democracy, provide a complexification in understanding relationships in all aspects of our
society, and possibly, in the sociology of education. As observed by Holanda (1995, p. 61, our
translation):
In a society with such clearly personalistic origins as ours, it is understandable
that simple person-to-person connections, independent and exclusive of any
tendency toward authentic cooperation between individuals, have almost
always been the most decisive. Aggregations and personal relationships,
although sometimes precarious, and, on the other hand, struggles between
factions, between families, and between regionalisms, made it a coherent and
amorphous whole. The peculiarity of Brazilian life at that time seems to have
been a singularly energetic accentuation of the affective, the irrational, the
passionate, and a stagnation or a corresponding atrophy of ordering,
disciplining, and rationalizing qualities. That is, exactly the opposite of what
seems suitable for a population on the verge of politically organizing itself.
Personalism in social and, in practice, teaching formation leaves deep marks that trigger
critical situations in psychosocial theoretical analysis. Reaffirmations of habitus, disposition in
fields, and social reproduction are fundamental concepts that unveil such complexities. From
authority, now required through discourse, manifested by attire and intonation of voice, to
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friendliness, personalism is a functional gear of the institutional teaching model. Achieving the
status of a chair patron can mean continuity and assurance, revealing an irrevocable side from
a personalistic point of view.
Analogically, more often than not, we reproduce the custom of calling state mandates
by the name of the ruler, reminiscent of economic plans and significant events named after the
protagonist. On the other hand, associating one's figure with failure arising from multiple
possible conditions is to assume individual consequences of a disastrous nature. Bourdieu
astutely analyzes the reflections of being an outsider, a member of excluded groups, amidst
academic reproducing ills.
Addressing the Brazilian dilemma, Roberto DaMatta (1997b) asserts that, at times, we
are punished for attempting to enforce the law or for our idea that we live in a genuinely
egalitarian universe (p. 216, our translation). When analyzing the expression, "Do you know
who you’re talking to", commonly used in Brazilian social life, he points to a highly significant
aspect of dramatic opposition between two ethics:
One is a "bureaucratic ethics"; the other is a "personal ethics." Indeed, when a
bureaucratic rule, universalizing and impersonal, loses its rationality in the
face of someone claiming a bond of kinship, marriage, friendship, or cronyism
with another person considered powerful within the system, we are effectively
dealing with a very complex situation. On one side, we have a rigid and
universal morality of impersonal laws or rules that emerge as a modernizing
and individualistic feature and are put into practice to subject all members of
society. On the other hand, we have the much more complicated morality of
total relationships imposed by family ties and webs of imperative social
relations, in which personal relationships and substantive connections allow
bypassing the rule or, which comes to the same thing, applying it rigidly. As
the old and dear Brazilian saying goes, 'to enemies, the law; to friends,
everything' (DAMATTA, 1997b, p. 217, our translation).
The skill of avoiding equality before the law and the consequent individualized
treatment is highlighted here (DAMATTA, 1997b). Hierarchical parameters in education
(teacher habitus) play an essential aspect of analysis that many authors delve into. Considering
specific cultural characteristics enhances the understanding of culture and brings theory closer
to the omitted reality. The educational curriculum, for example, presents an opportunity for
questioning and considering the structuring of the Brazilian educational system and the
curriculum itself in the dispute over contents, models, languages, histories, theories, values, and
behaviors to be selected and represented. To this framework, there is a tendency to analyze "[...]
forms of knowledge such as literature, arts, philosophy, and sciences specific to European
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societies as superior to the human beings, cultures, and civilizations of other regions of the
world" (PRAXEDES, 2008, p. 2, our translation).
As for the political competence of the colonizers in hindering the development of
intellectual culture in Brazil, it is emphasized that the
[...] transmission of culture occurs through systematic and non-systematic
means; the most used and developed systematic means is the form of
education called teaching; in all times and places, with development
paralleling the development of societies, there has always existed, to a greater
or lesser extent, a system for the systematic transmission of knowledge, a
structure of teaching; complex societies, such as capitalist ones, demand
complex teaching apparatuses, complex teaching structures; such apparatuses
and structures are, in whole or in part, components of the State apparatus; thus,
they transmit the official culture, the one that adheres to the social
characteristic that the dominant culture is the culture of the dominant classes.
In considering the issue of the University in Brazil, the first aspect to highlight
is the privilege inherent in higher education, reaching a tiny portion of young
people (SODRÉ, 1970, p. 112-113, our translation).
It is clear that government after government, the educational project of higher education
can evolve and bring changes in the number of available spots and the percentage of people
accessing Brazilian colleges and universities (especially private ones), for better or worse.
However, in practice, there is no evident and effective concern that they are doing work that
will bring about fundamental changes. Proof of this is the growth of private institutions and
what, for the most part, they deliver to communities and society in general. It is very little
compared to the concessions and authorizations they receive.
Final considerations
Higher education still proves to be decisive in the pursuit of increased symbolic,
economic, and social capital
5
. The wage percentage of people with more than 15 years of
education reveals a huge difference between those who study more and those who do not review
or have fewer years dedicated to studies. Even though research indicates that the wage gap after
the pandemic has decreased in relation to those with fewer years of education, there is still a
5
According to Bonnewitz's interpretation, "At first glance, the notion of capital is linked to the economic approach.
The recognized properties of capital explain the analogy: it accumulates through investment operations, is
transmitted through inheritance, and allows profits to be extracted according to the opportunities the holder has to
operate the most profitable applications. These characteristics make it a heuristic concept if, as Bourdieu does, its
use is not limited only to the economic sphere. Indeed, it is possible to distinguish four types of capital: economic,
cultural, social, and symbolic" (BONNEWITZ, 2003, p. 53, our translation).
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significant difference between them, as shown by the work of economists Veloso, Filho, and
Peruchetti (2022) from FGV-IBRE
6
.
However, it is necessary to consider that the growing contingent of demand for the
highest degree of appreciation by society (status) is greater than the actual number of places
available for all of them. These are scarce resources. From the Brazilian population of
203,062,512 people, according to the Demographic Census (IBGE, 2023), only 9,443,597
million are pursuing Higher Education (INEP's Higher Education Census, 2021). Of these
students, 7,367,080 million are in private higher education.
Private educational institutions (but not only them) are concerned, on the one hand, with
forming students capable of performing technical and specific tasks proficiently. Over time,
they also realize the need to educate citizens and individuals who know how to live in society
in a democratic and civilized manner, following the guidelines proposed by the dominant
classes and strictly adhering to their assumptions. One of the paradoxes of liquid modernity
7
is
the need to deepen knowledge about humanity as if we were not human. Our society teaches
individuals about self-sufficiency while simultaneously delineating the paths through which
their desires and wishes will unfold.
The mental structure that society provides, an antithesis between innate
individuality and an "external" society, is then used to explain phenomena that
are actually the product of discrepancies within society, the mismatch between
the social orientation of individual effort and the social possibilities of
consummating it (ELIAS, 1994, p. 121, our translation).
The difficulty of achieving regulatory parameters (if this is possible and desirable when
habitus disables us for it) occurs not only because coexistence in complex societies is also
challenging but fundamentally because the harmony of these relationships is only achieved (and
for a select group of people) when socially elaborated goals can be realized. This makes the
teaching process more complex today and significantly increases the responsibility of
educational institutions regarding their social responsibility and fundamental role in education.
Additionally, Pereira (2020, p. 78, our translation) emphasizes:
6
Impactos da educação no mercado de trabalho (Impacts of Education on the Labor Market) at the Regis
Bonelli Productivity Observatory FGV (2022).
7
Bauman refers here to a society where the "individualized and privatized version of modernity, and the weight
of the web of standards and responsibility for failure, falls mainly on the shoulders of individuals. It is the time of
liquefaction of patterns of dependence and interaction. They are now malleable to a point that past generations did
not experience and could not imagine; but like all fluids, they do not hold their shape for long. Giving them shape
is easier than keeping them in it" (BAUMAN, 2001, p. 14, our translation).
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To stimulate this logic in education, market rules, according to Barroso
(2004), align educational objectives with effectiveness criteria defined by
competition based on assumptions that attribute a relevant role to education to
subsidize the needs of the productive system and wealth. This has weakened
the conception of education as a value for social well-being. This weakening,
observed within universities, has generated new forms of pedagogical
organization and thus creates a compatibility based on the guidelines of new
modes of regulation of educational policies, adopting the business
management model and promoting measures, with privatizing tendencies in
Teaching Centers, Course Coordinations, Departments, and Research Sectors.
In practice, the presence of values of competition, rivalry, economic
excellence, and flexibility is increasingly evident, confirming the existence of
a pronounced one-sided relationship between education and the market.
The need to effect changes in the educational landscape implies an expansion of debates.
Addressing sensitive issues related to the approval and authorization processes of courses,
genuine social responsibility towards the communities where institutions are located,
intellectual honesty, the training of teachers and coordinators, and the salaries of teachers and
working conditions offered in all aspects. Such paradoxes characterize Brazil's private higher
education, presenting challenges awaiting courageous and fearless solutions.
REFERENCES
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CRediT Author Statement
Acknowledgements: Special thanks to Prof. Dr. Ione Ribeiro Valle from the Department
of Graduate Studies in Education at the Federal University of Santa Catarina, leader of the
Pierre Bourdieu Sociological Research Laboratory (LAPSB - CNPq), and all the members
of this research group. The debates and partnerships from this program have contributed to
the development and construction of the ideas in this article. Thanks also to the members of
the Center for Contemporary Sociology Studies: Zygmunt Bauman (NESC - CNPq), from
the Unisociesc University Center, who, over the years, has inspired articles, debates, and
discussions that enabled the development of articles like this.
Funding: No funding was received.
Conflicts of interest: There are no conflicts of interest.
Ethical approval: Ethical approval was not required.
Data and material availability: Not applicable.
Authors' contributions: The author participated in research group discussions, conducted
a literature review, and wrote the article.
Processing and editing: Editora Ibero-Americana de Educação.
Proofreading, formatting, normalization and translation.